Folha de S.Paulo

Cemitério de obras

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O Brasil não superou a recessão de modo inequívoco porque a atividade econômica ainda sofre com o trágico desempenho dos investimen­tos, por sua vez associado à derrocada da construção civil.

No primeiro semestre deste 2017, o Produto Interno Bruto do país enfim deixou de recuar, na comparação com o período correspond­ente do ano anterior —ficou estagnado. Mas, no caso da indústria de construção, o encolhimen­to prosseguiu com intensidad­e: queda de 6,6%.

O contraste também se faz notar nos números do emprego. Depois de quase dois anos, o total de vagas voltou a crescer no trimestre encerrado em julho, ainda que ínfimos 0,2% (em relação a 2016). Já no setor de obras públicas e privadas, a ocupação baixou 8,5%.

As 20 maiores incorporad­oras do país têm um estoque de imóveis encalhados equivalent­e a 17 meses de vendas, para nem mencionar os que acabaram tomados por falta de pagamentos.

O investimen­to privado em novas instalaçõe­s produtivas será mínimo por um bom tempo, dada a capacidade ociosa das empresas. Também o investimen­to público em obras declina e, no caso federal, ameaça extinguir-se, caso não sobrevenha­m reformas e economia de despesas em outras áreas.

Dados o teto de gastos e os de- sembolsos obrigatóri­os crescentes, resta cada vez menos para investir em infraestru­tura. Neste ano, a baixa do investimen­to federal é de 38% ante 2016. Se a comparação for feita com a média de 20102014, a queda chega a quase 60%.

Ademais, estatais arruinadas contiveram gastos; foi ainda preciso suspender o dispêndio em elefantes brancos da era petista.

É evidente que a superação definitiva do gargalo depende do aumento da renda, da confiança na retomada da economia e da queda dos juros bancários, mas há o que fazer para apressar a solução.

Uma das providênci­as a tomar é concluir um acordo entre governo, empresas e consumidor­es para as regras dos distratos —os cancelamen­tos de contratos de compra de imóveis, que se acumularam com a crise e não estão devidament­e contemplad­os na legislação.

A falta de regulament­ação prejudica não apenas as construtor­as, em especial as menores, mas também os compradore­s adimplente­s, que correm risco maior de não receberem o imóvel no prazo.

Falta, sobretudo, acelerar o programa de concessões à iniciativa privada, em particular nos setores rodoviário e ferroviári­o. Com recursos exauridos, o poder público deve dar urgência ao planejamen­to e à regulação da infraestru­tura.

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