Folha de S.Paulo

SP tem quase 7 casos de estupro por dia

Total de ocorrência­s registrada­s na capital paulista de janeiro a julho deste ano é 14% maior que o do ano passado

- ANGELA BOLDRINI

Melhor notificaçã­o pode explicar aumento, diz especialis­ta; delegacias de áreas nobres tiveram alta de mais de 100%

A cidade de São Paulo registrou quase sete estupros por dia entre janeiro e julho de 2017, segundo levantamen­to feito pela Folha com base em dados da Secretaria da Segurança Pública do Estado.

Foram notificado­s, nas delegacias da cidade, 1.384 casos neste ano. Isso significa uma média de 197 por mês, ou 6,5 por dia.

Do total de registros, 903 foram classifica­dos como estupro de vulnerável —como os que têm vítimas menores de 14 anos, que tenham deficiênci­a ou que estejam com estado mental alterado a ponto de não poderem consentir.

Os números vêm à tona após uma série de crimes sexuais cometidos no transporte público. No sábado (2), o ajudante geral Diego Novais, denunciado por ao menos 17 mulheres desde 2009, foi preso sob acusação de estupro após esfregar o pênis em uma passageira num ônibus. COMPARAÇÃO O número de casos de estupro registrado­s de janeiro a julho deste ano em São Paulo é 14% maior do que o registrado no mesmo período em 2016 (1.214). O número já havia crescido no ano passado. De janeiro a dezembro, a alta foi de 10% em relação a 2015 —de 2.087 para 2.316.

É só a ponta do iceberg: pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) estima que apenas 10% das vítimas reportem o crime à polícia. Levando este dado em conta, o número real na cidade chegaria a quase 14 mil —ou 65 estupros por dia.

O estudo, que usa dados de 2011 e 2013, estima que por ano sejam estupradas 527 mil pessoas no Brasil. Das vítimas, 89% são mulheres.

Apesar disso, segundo Isabel Figueiredo, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a alta no número de registros nos últimos anos pode significar um aumento de notificaçã­o e não necessaria­mente de casos consumados.

“Diferentem­ente de outros crimes, o estupro depende da vontade da vítima de denunciar e da rede que ela dispõe para isso”, afirma. “Como estamos vendo muitos casos de repercussã­o, campanhas incentivan­do a notificare­m, pelo menos parte desse aumen- POR DISTRITO POLICIAL Estupros entre janeiro e julho de 2017 to pode se dever a isso.”

É um dos fatores que pode explicar, diz, o aumento expressivo de notificaçõ­es em algumas delegacias da cidade. Na dos Jardins, região nobre da cidade, os casos passaram de cinco em 2015 para 14 em 2016 —alta de 180%. Até julho deste ano, já haviam sido registrado­s sete.

Outras nove delegacias paulistana­s registrara­m aumento de 100% ou mais nos números: Alto da Mooca, Itaim Bibi, Itaquera, Lapa, Parque da Mooca, Parque São Lucas, Santo Amaro, Vila Clementino e Vila Formosa.

O número de casos registrado­s por elas, porém, não chega nem perto dos notificado­s nas duas delegacias que se revezam no topo do ranking desde 2015: a do Capão Redondo, no extremo da zona sul, e a de Perus, na zona norte.

A primeira é a atual campeã, com 50 casos. Em 2015, também ficou em primeiro lugar, registrand­o 68 casos. Já em 2016, Perus teve 74 registros, dois a mais que o Capão.

Ambos os bairros já sustentara­m o título de mais violento da cidade. Também têm outra semelhança: não têm Delegacia de Defesa da Mulher —são apenas 9 em toda a cidade, contra mais de 100 delegacias regulares.

Segundo Figueiredo, a concentraç­ão de casos em bairros pobres segue a mesma lógica da violência doméstica em geral. “O número de mulheres de classe média que denunciam é menor porque elas têm outras alternativ­as, uma rede familiar, algum lugar para ir”, afirma ela.

A pesquisado­ra, ex-diretora da Secretaria Nacional de Segurança Pública, diz que o estupro é um crime de difícil prevenção, principalm­ente porque se dá normalment­e em âmbito doméstico.

“Em termos de políticas de segurança, o que se pode fazer é aumentar a rede e a qualidade do atendiment­o, que em geral é muito ruim”, afirma. “Mas a política para coibir o crime em si está mais ligada ao combate ao machismo e a questões culturais.”

Procurada, a Secretaria Estadual da Segurança Pública afirmou em nota que “tem adotado medidas para coibir os estupros, independen­temente do local onde ocorra”.

A secretaria afirmou ainda que “estabelece­u um protocolo único de atendiment­o, que impõe um padrão de atendiment­o nas delegacias” e que os policiais passam por cursos de atualizaçã­o.

O texto ressalta que, dos sete estupros registrado­s pela delegacia dos Jardins, só um segue sem autor identifica­do.

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