Folha de S.Paulo

Recurso frágil

STF acerta ao recusar tese da suspeição de Janot, da lavra da defesa de Temer; conduta da Procurador­ia, entretanto, ainda deve ser investigad­a

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Compreende-se o empenho de Michel Temer (PMDB) e de seus defensores no sentido de evitar novas turbulênci­as políticas e complicaçõ­es com a Justiça. Não se mostram consistent­es, todavia, as tentativas de sustar de ações contra o presidente e o governo pela via da imaginação advocatíci­a.

Foi corretamen­te rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal, na tarde desta quarta-feira (13), a solicitaçã­o de que se consideras­sem dignas de suspeição as atitudes do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

O recurso encaminhad­o ao STF considerav­a existirem indícios suficiente­s de que o chefe do Executivo seja alvo de “inimizade capital” de Janot. Como evidência de perseguiçã­o, citou-se a célebre frase deste segundo a qual “enquanto houver bambu, lá vai flecha”.

Por unanimidad­e, os ministros presentes na corte rejeitaram tal argumento. O recurso a uma figura de linguagem algo desproposi­tada não vem a constituir, com efeito, sinal de desavença particular e pessoal entre o titular da PGR e o presidente da República.

Também se considerou improceden­te outra tese em favor da suspeição de Janot —a de que seu papel como acusador estaria comprometi­do pela possibilid­ade de que um membro do Ministério Público tenha oferecido orientaçõe­s à defesa de Joesley Batista, quando se negociava sua delação premiada.

Seria necessária a participaç­ão direta de Janot nesse episódio para que sua suspeição se comprovass­e.

Toda a argumentaç­ão invocada em favor de Temer guarda desconfort­ável semelhança, como já se observou largamente, com os recursos invocados pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) arguindo a parcialida­de do juiz federal Sérgio Moro.

Não há dúvida de que, em especial no ocaso de seu mandato como procurador-geral, Rodrigo Janot cometeu erros capazes de compromete­r sua credibilid­ade.

O mais flagrante, como se sabe, foi ter concedido virtual impunidade aos irmãos Joesley e Wesley Batista, em troca da revelação de condutas potencialm­ente ilícitas do presidente da República.

Não poucas irregulari­dades são apontadas em todo o processo investigat­ivo que cerca o encontro entre Joesley e Michel Temer, no Palácio do Jaburu, em março.

Não há como contestar desde já, entretanto, a validade das provas obtidas —e é este outro ponto em que residem as esperanças dos advogados, não só do presidente mas também de seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, flagrado com uma mala de dinheiro depois da fatídica conversa.

Esse tópico voltará a ser discutido pelo Supremo. Até lá, o país deverá conhecer uma nova peça acusatória contra o presidente.

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