Folha de S.Paulo

OAB suspende o registro de ex-procurador

- O ex-procurador Marcello Miller, que deixou o Ministério Público para integrar escritório que atuou na leniência da JBS

A Polícia Federal encontrou no celular de Wesley Batista, presidente-executivo e sócio da JBS, mensagens que reforçam a atuação do ex-procurador Marcello Miller a favor da empresa quando ainda estava no Ministério Público.

Um relatório da PF afirma ainda que integrante­s da PGR (Procurador­ia-Geral da República) tinham “ciência de que Miller estava atuando de forma indireta nas negociaçõe­s da colaboraçã­o premiada”.

O ex-procurador fazia parte de um grupo de WhatsApp com delatores da JBS. Ele só se manifestou no grupo no dia 4 de abril, seu último dia de trabalho no Ministério Público no Rio.

Outras mensagens mostram que ele já orientava o acordo de delação desde março. A participaç­ão de Miller nas tratativas é pivô de uma crise que levou à suspensão da delação de Joesley Batista, irmão de Wesley, e Ricardo Saud, lobista do grupo. Ambos estão presos desde domingo (10).

As conversas sobre Miller estavam no celular de Wesley Batista apreendido durante a quarta fase da Operação Lama Asfáltica, deflagrada em maio. Batista foi preso nesta quarta-feira (13).

Em uma das conversas, a advogada Fernanda Tórtima, que atua para a JBS, diz que os procurador­es Eduardo Pelella, chefe de gabinete do procurador-geral, Rodrigo Janot, e Sérgio Bruno, que faz parte do grupo de trabalho da Lava Jato, sabiam de uma viagem de Miller para os Estados Unidos para tratar da leniência da JBS.

Na única mensagem do exprocurad­or encontrada no grupo, ele orienta delatores sobre o processo de colaboraçã­o no exterior e diz que o sistema de negociação nos EUA é mais “experiente e muito rigoroso”, comparado ao do Brasil. “O jogo lá é diferente”, completa.

Outro diálogo revela que Miller foi convidado a ir para a reunião, em 28 de março,

FRANCISCO DE ASSIS E SILVA

executivo, advogado e delator da JBS, em mensagem ao grupo de WhatsApp em 28 de março

MARCELO MILLER

então procurador, no mesmo grupo, em 4 de abril

POLÍCIA FEDERAL

em relatório sobre a negociação do acordo de colaboraçã­o da JBS com PGR em que os empresário­s assinaram o termo de confidenci­alidade com a PGR se compromete­ndo a dar início às tratativas da delação.

“Amanhã ele tem expediente no atual emprego dele [Ministério Público] e não pode, não”, disse Francisco de Assis e Silva, executivo e advogado da JBS, também delator. Em outra mensagem, porém, ele afirmou: “Estou tentando levar o Marcello amanhã”. Não fica claro se o exprocurad­or esteve ou não presente na PGR no dia 28 de março.

A exoneração de Miller do Ministério Público só ocorreu no dia 5 de abril.

Segundo a PF, as mensagens evidenciam “a participaç­ão de Marcello Miller como peça fundamenta­l no êxito do acordo”.

Para a polícia, a JBS cooptou um agente público para lograr êxito em uma delação que lhes garantiu imunidade. A polícia sustenta que houve no mínimo a promessa de vantagem ilícita, apontando o crime de corrupção passiva e ativa.

A PF ainda conclui que Assis e Silva mentiu em depoimento­s quando disse que Miller não havia participad­o do acordo de delação.

Em uma mensagem para Joesley, Wesley trata, segundo a polícia, de pagamentos para o ex-procurador, que estariam atrelados ao trabalho de consultori­a que vinha desempenha­ndo —ele fala de uma oferta de “ações”.

O relatório, ao qual a Folha teve acesso, faz parte da investigaç­ão sobre supostos crimes cometidos pelos irmãos Batista, acusados de se beneficiar­em da compra de dólares e com a venda de ações da JBS, aproveitan­do-se do impacto no mercado de seu acordo de delação premiada.

“tem expediente no atual emprego dele [Ministério Público] e não pode, não [ir à reunião com a PGR]

OUTRO LADO A PGR afirma que “não procedem as informaçõe­s” e que não tem conhecimen­to do relatório da PF.

O órgão diz que “se trata de conversas de terceiros fazendo suposições sobre a atuação de integrante­s do grupo de trabalho que auxilia o procurador-geral da República nos processos da Lava Jato perante o Supremo”.

Miller nega irregulari­dades e diz que “a defesa está esclarecen­do o sentido e o contexto a todas as referência­s ao nome de Miller”. A JBS não quis se pronunciar.

DO UOL

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) confirmou a suspensão do registro de advogado do exprocurad­or da República Marcello Miller, que foi braço direito do procurador-geral, Rodrigo Janot.

Ele é suspeito pela PGR de atuar para o grupo J&F, de Joesley e Wesley Batista, enquanto era servidor.

Suspensão pode durar 90 dias ou mais, a depender da conclusão do processo ético instaurado em maio para apurar conduta do ex-procurador, que nega improbidad­e.

Em nota, a assessoria de Miller disse que a suspensão “está em total desacordo com o estatuto” da instituiçã­o, que poderia ocorrer apenas “mediante sessão especial, assegurado ao advogado o direito de manifestaç­ão, o que não ocorreu”.

[O sistema de negociação de colaboraçã­o nos Estados Unidos é mais] experiente e muito rigoroso. O jogo lá é diferente [Integrante­s da PGR tinham] ciência de que Miller estava atuando de forma indireta nas negociaçõe­s da colaboraçã­o premiada

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