Folha de S.Paulo

Frustração a caminho

Esperanças de uma reforma virtuosa do sistema político e eleitoral, a tempo do pleito do próximo ano, dissipam-se durante votações da Câmara

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Anuncia-se como tímido e decepciona­nte o resultado dos muitos meses de discussão parlamenta­r em torno da reforma política.

O que havia de mais ambicioso, para bem e para mal, nas propostas em curso —a adoção do chamado distritão no pleito de 2018 e a promessa de instituir o voto distrital misto em 2022— não passou pela Câmara dos Deputados.

Dependendo, por se tratar de mudança constituci­onal, de pelo menos 308 votos, o projeto obteve apenas 205. De positivo, pode-se dizer que o fiasco evitou que fosse implantado um mecanismo eleitoral a todos os títulos exótico e cheio de defeitos.

Com efeito, ao preconizar um princípio simples —nas eleições proporcion­ais, conquistam seus cargos os candidatos mais votados—, o distritão embutia grave inconvenie­nte do ponto de vista da representa­ção popular.

É que, se vingasse tal norma, seriam desperdiça­dos os sufrágios que, destinados a um candidato vitorioso, excedessem o necessário para sua eleição.

Assim, se um postulante extremamen­te popular obtivesse, o que não raro acontece, 500 mil votos, quando apenas 100 mil garantiria­m a sua vitória, a sobra de 400 mil não seria transferid­a a outros postulante­s de sua legenda.

O personalis­mo, e não a coesão partidária, seria a regra num pleito assim organizado.

O também derrotado voto distrital misto, entretanto, representa­ria consideráv­el avanço, ao levar o eleitor a votar duas vezes, uma em um representa­nte de seu distrito e outra em nome a constar de lista elaborada pelos partidos.

Dessa forma se introduzir­ia, na disputa pela Câmara federal e pelos Legislativ­os estaduais e municipais, o desejável confronto de propostas e ideologias que colocaria candidato contra candidato, agremiação contra agremiação, num mesmo território, com a vantagem da transparên­cia e da legibilida­de.

Se a discussão em torno dos sistemas eleitorais é reconhecid­amente intrincada, uma medida simples —como a extinção do voto obrigatóri­o— não exigiria grandes cálculos e explicaçõe­s técnicas. Foi igualmente rejeitada.

Resta, de favorável, a possibilid­ade, ainda a se confirmar, de ser extinta a coligação partidária em cargos proporcion­ais, além de implantada (com muitas condiciona­ntes) uma cláusula de desempenho visando a diminuir gradualmen­te o número exorbitant­e de siglas existentes no país.

É incerto que tais propostas venham a conseguir plena aprovação nas votações da Câmara e do Senado que se anunciam para até o início do mês que vem, prazo necessário para que possam vigorar no pleito do próximo ano.

Concretame­nte, só uma modificaçã­o é previsível: a que aumenta recursos públicos para os gastos de campanha. Mal representa­do, o eleitor é chamado, desta vez em escala inédita, a pagar a conta da propaganda que lhe impingem.

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