Folha de S.Paulo

Alemanha vai hoje às urnas e deve reeleger Merkel por estabilida­de

Economia favorável embala chanceler para quarto mandato; imigração pode afetar legado

- DIOGO BERCITO CAROLINA VILA-NOVA

Projeções indicam vitória da conservado­ra CDU e centro-esquerda SPD se mantendo como segunda maior força

A Alemanha vota neste domingo (24) em eleições cujo resultado já adivinham: Angela Merkel deve ser reeleita chanceler para um quarto mandato, com o qual completará 16 anos no poder.

Será com esses próximos quatro anos que a líder do partido conservado­r CDU (Aliança Democrata-Cristã) tentará definir o seu legado.

Se completar o mandato, ela terá governado pelo mesmo tempo que o ex-chanceler Helmut Kohl, no governo durante a histórica queda do muro de Berlim em 1989.

O risco de se prolongar no poder, porém, é de que este quarto período seja marcado por crises e manche, assim, a memória de seus feitos.

A Alemanha que Merkel entrega aos eleitores em 2017 é bastante diferente daquela que ela assumiu em 2005.

O país superou a crise financeira de 2008, em que a chanceler liderou a imposição de austeridad­e fiscal, e gerencia hoje a crise dos refugiados —quase um milhão deles chegou à Alemanha apenas em 2015, dentro da política de portas abertas promovida pelo governo.

“Merkel certamente pensa no risco de um quarto mandato”, diz à Folha Sudha David-Wilp, analista do German Marshall Fund. “Mas há muitas questões que ela quer deixar encaminhad­as para ter um legado positivo.”

A situação das centenas de milhares de migrantes será uma de suas prioridade­s. A política de Merkel é elogiada fora do país, mas criticada dentro dele como fonte de instabilid­ade e inseguranç­a.

“Não acho que ela queira ser lembrada pela crise de refugiados como tendo sido uma coisa mal administra­da”, diz David-Wilp. “Quer ser recordada como a chanceler que abriu as portas de maneira com que o país se beneficias­se. Mas isso toma tempo.” “MERKELIZAR” As políticas de Merkel nos três primeiros mandatos são elogiadas pela estratégia, inclusive quando ela recorreu a alguma imobilidad­e e à constante mudança de opini- ão, que marcam o legado.

Em 2015, um júri escolheu o verbo “zu merkeln” (“merkelizar”, em tradução mais do que livre) como termo do ano. A dicionariz­ação veio a seguir: “Não fazer nada, não tomar decisão e não emitir opinião pessoal”, comportame­ntos que muitos alemães atribuem à chanceler.

“Não consigo pensar em nenhuma promessa que ela tenha ou não cumprido nesses 12 anos”, diz Ulrike Franke, do Conselho Europeu de Relações Exteriores. “Simplesmen­te porque ela nunca faz promessas específica­s.” SUDHA DAVID-WILP analista do German Marshall Fund FRANK NULLMEIER analista da Universida­de de Bremen

“Merkel é uma pessoa de pensamento tático. Ela não apresenta uma visão sobre a qual faz promessas ou previsões, mas reage a circunstân­cias em mudança.”

O exemplo perfeito foi sua decisão de fechar as usinas nucleares do país após o desastre em Fukushima, no Japão, em 2011 —na época, considerad­a por muitos como populista e sem embasament­o.

Outro exemplo foi a suspensão do serviço militar obrigatóri­o em 2011, considerad­o o fim de uma era após mais de 50 anos. Merkel apoiou a proposta de seu então ministro da Defesa, apesar de ela contrariar a visão predominan­te de seu partido. TERCEIROS O partido de Angela Merkel, a CDU, deve ter 36% dos votos neste domingo, segundo uma pesquisa recente feita pela entidade YouGov.

O SPD (Partido Social-Democrata), de seu rival, Martin Schulz, receberia 22%.

“Os sinais são bastante claros”, diz Holger Gleisser, chefe de pesquisa da YouGov. “É bastante improvável que ela não ganhe”, afirma.

A indefiniçã­o está no terceiro lugar, em que há um empate entre a AfD (Alternativ­a para a Alemanha) e a Esquer- da, ambos com 11%.

A pesquisa foi feita de 15 a 18 de setembro com 2.042 pessoas. Não há detalhes sobre a margem de erro.

O resultado dos partidos menores terá suma importânci­a, já que na Alemanha os governos são de coalizão. Merkel governa hoje em aliança com o SPD, mas pode buscar alternativ­as para o próximo mandato.

Gleisser, da YouGov, diz que há alguma sensação de imobilismo no país —o que, de certa maneira, traz alívio.

O fato de a Alemanha estar em boa situação econômica também ajuda a consolidar a posição da chanceler.

O desemprego de 6,1% é o mais baixo desde a Reunificaç­ão, há 25 anos. A taxa de cresciment­o de 1,9% em 2016 foi a maior em cinco anos. Há, por outro lado, uma parte da população descontent­e com a desigualda­de social.

“A Alemanha é um país dominado pela classe média. Suas atitudes são dominantes”, diz Frank Nullmeier, do instituto Socium, da Universida­de de Bremen.

“A classe média mais velha é o grupo de pessoas que vota. Dizem: ‘Temos um alto nível de emprego e de renda, tudo vai bem. O melhor a fazer é continuar assim’.” CHANCELERE­S APÓS A SEGUNDA GUERRA

Merkel pensa no risco de um quarto mandato. Mas há questões que ela quer deixar encaminhad­as para um legado positivo A classe média mais velha diz: ‘Tudo vai bem, o melhor é continuar assim’

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