Folha de S.Paulo

Juro baixo à frente

- SAMUEL PESSÔA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado;

O BANCO Central (BC) divulgou na quinta-feira da semana que passou o Relatório Trimestral de Inflação, o famoso RTI. Nesse documento, o BC divulga suas principais projeções e sua análise do cenário macroeconô­mico doméstico e internacio­nal, que pautam as ações do órgão regulador do sistema financeiro e tutor da estabilida­de monetária.

O item mais aguardado do RTI são as simulações que o BC apresenta, consideran­do diversos cenários, para a inflação futura.

Nessa edição do RTI o Banco Central inovou, aumentando muito a transparên­cia do relatório. Corajosame­nte, o BC divulgou suas projeções para um horizonte muito mais longo do que habitualme­nte fazia. Em vez dos nove trimestres habituais, o horizonte de projeção foi alongado para 14 trimestres.

Para o cenário de mercado —que é aquele que considera taxas de câmbio e taxa Selic segundo as previsões da pesquisa Focus (levantamen­to conduzido semanalmen­te pelo BC com analistas de mercado)—, o relatório indica que a inflação (sempre acumulada em 12 meses) estará em 3,6% no terceiro trimestre do ano que vem e, em seguida, estabiliza­r-se-á em torno de 4% até o fim de 2020.

Dado que a pesquisa Focus indica Selic para o biênio 2019-2020 em 8%, os modelos do Banco Central já trabalham com juro neutro — aquele que nem eleva nem reduz a inflação— na casa de 4% ao ano. É um enorme avanço para o país, visto que até alguns anos atrás as estimativa­s sinalizava­m valores mais próximos de 6% ao ano.

Há nessa queda do juro neutro uma melhora real e duas promessas.

A melhora real é a forte queda das taxas de juros internacio­nais.

Esse é um fenômeno que ocorre desde o fim dos anos 80, pelo menos, e que em seguida à crise das hipotecas americanas de baixa qualidade, de setembro de 2008, acelerou-se. A economia brasileira —aberta e necessitad­a de capitais internacio­nais para fechar sua carência doméstica de poupança— se beneficia do excesso de poupança vigente no mundo.

A primeira promessa é a aprovação da proposta de emenda constituci­onal (PEC) que estabelece­u um teto ao cresciment­o do gasto público. Essa mudança de regime fiscal alterará completame­nte o impacto do setor público sobre a demanda agregada da economia.

Após duas décadas e meia em que sistematic­amente o setor público adicionava pressão sobre a demanda agregada e, portanto, pressionav­a a formação dos juros, teremos uma alteração de rota.

A segunda promessa é a aprovação da lei que transferiu ao Congresso Nacional o poder de conceder subsídios ao investimen­to nas operações do BNDES.

A nova taxa de juros criada pela lei 13.483, de 21 de setembro de 2017, é um grande passo para convergirm­os para um regime de juros reais de equilíbrio mais baixos. É um primeiro grande passo para mudar totalmente o regime de nossa política parafiscal.

A reforma da Previdênci­a e, provavelme­nte, algumas medidas para a elevação da receita completarã­o o ajuste fiscal necessário para que nós consigamos perenizar as boas projeções do RTI e —por que não?— consigamos criar as condições para juros ainda menores. Este será o principal desafio do presidente que for eleito em 2018.

Os juros não são altos porque os banqueiros conspiram. Juros baixos resultam de anos de política econômica sólida e fiscalment­e responsáve­l. Oxalá a sociedade escolha esse caminho no processo eleitoral do ano que vem.

Principal desafio do próximo presidente será criar as condições para que taxa continue em declínio

SAMUEL PESSÔA,

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