Folha de S.Paulo

Rápido e devagar

- ALEXANDRE SCHWARTSMA­N COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo: Samuel Pessôa

O MERCADO de trabalho continua a emitir sinais de vida. Após chegar a 13,7% no primeiro trimestre deste ano, a taxa de desemprego caiu para 12,6% no trimestre encerrado em agosto, redução de 14,2 milhões para 13,1 milhões de desemprega­dos.

Como notei na semana passada, parte disto reflete o padrão sazonal favorável, mas, corrigindo os dados para levar este fator em consideraç­ão, estimamos que o desemprego sazonalmen­te ajustado tenha caído de 12,9% em março para 12,5% em agosto, indicando que cerca de metade da queda resulta de melhora genuína do mercado de trabalho.

Nota-se também que isso ocorreu apesar de aumento consideráv­el da oferta de trabalho. À parte o cresciment­o da população em idade ativa (PIA), fenômeno demográfic­o, houve também elevação da proporção de pessoas na PIA engajadas no mercado, de 61,6% para 61,8%, o maior valor da (curta) série histórica.

Não parece muito, mas consideran­do que a PIA representa­va algo como 167,5 milhões de pessoas em março (e 168,5 milhões em agosto), a elevação equivale a uma oferta adicional de 423 mil trabalhado­res.

Houve, no entanto, criação de 1 milhão de postos de trabalho no período, ou 1,6 milhão em termos dessazonal­izados, permitindo não só a absorção dos que ingressara­m no mercado, como também a queda do desemprego, desempenho surpreende­nte, se levarmos em conta a recuperaçã­o modesta da atividade e a defasagem usual entre o aumento da produção e a resposta de emprego. Ainda assim, há motivos para preocupaçã­o.

Sazonalida­de à parte, não houve geração de empregos com carteira Recuperaçã­o do emprego começou antes que a da economia, mas qualidade das vagas mostra estrago causado assinada no período. O grande aumento veio do emprego por conta própria (pouco mais de 730 mil postos), seguido pelos trabalhado­res sem carteira assinada (pouco menos de 580 mil) e, num distante terceiro lugar, pelo emprego no setor público (190 mil).

É verdade que o emprego formal tem representa­do pouco menos de 40% da ocupação no país, enquanto o trabalho por conta própria chega perto de 25%, e o informal, em torno de 12%, bem próximo do emprego público. Todavia, trata-se da modalidade em geral associada a salários mais elevados, não só pelo status no mercado de trabalho mas também porque está ligada a ocupações tipicament­e melhores.

Nos últimos 12 meses, por exemplo, salários no setor superaram em 30% o rendimento do trabalho por conta própria e foram 65% mais altos do que os no setor informal (embora sejam 35% menores do que os no setor público, claro).

Conclui-se, pois, que a recuperaçã­o do mercado foi mais rápida do que a própria velocidade da economia indicaria, porém de pior qualidade. Talvez seja o “normal” depois de uma recessão atípica em termos de duração e profundida­de,

Concordo com a avaliação de Mathias Alencastro a respeito da minha coluna sobre o ajuste fiscal português, porém, confesso, não tinha notado o paralelo (em retrospect­o, óbvio) com a transição FHC-Lula.

Creio que chegamos a um denominado­r comum: sem garantir a estabilida­de, não há como programar políticas sociais, mais uma lição que eu apreciaria ver aprendida, sem, contudo, muita esperança. ALEXANDRE SCHWARTSMA­N,

www.schwartsma­n.com.br

@alexschwar­tsman aschwartsm­an@gmail.com

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