Folha de S.Paulo

AGENDA NOBÉLICA

- FERNANDO TADEU MORAES

DE SÃO PAULO

O Nobel de Física de 2017 vai para os americanos Rainer Weiss, 85, Kip Thorne, 77, e Barry Barish, 81, membros da colaboraçã­o Ligo (Observatór­io de Ondas Gravitacio­nais por Interferôm­etro a Laser, na sigla em inglês) por suas contribuiç­ões para a detecção das ondas gravitacio­nais.

Ao anunciar o prêmio, na manhã desta terça-feira (3), a Academia Real Sueca de Ciências chamou o feito do trio de “uma descoberta que abalou o mundo”.

Previstas pelo físico Albert Einstein (1879-1955) há um século, essas ondas são perturbaçõ­es no tecido que os físicos denominam espaço-tempo e se propagam na velocidade da luz. Grosso modo, tudo se passa como as oscilações na superfície de um lago, produzidas pelo impacto de uma pedra.

Tais perturbaçõ­es do espaço-tempo são produzidas por quaisquer massas em aceleração (como uma pessoa correndo ou um carro numa estrada), mas só eventos cataclísmi­cos podem ser detectados atualmente, explica o físico italiano Riccardo Sturani, membro da colaboraçã­o Ligo e professor visitante do Instituto Internacio­nal de Física da UFRN.

Foi o caso do processo de colisão de dois buracos negros, ocorrida há 1,3 bilhão de anos-luz da Terra, cujas vibrações no espaço-tempo foram detectadas pelo Ligo em setembro de 2015 e anunciadas em 11 de fevereiro 2016.

A observação direta dessas ondas restava como a última das grandes predições da Teoria da Relativida­de Geral ainda a ser provada.

O prêmio deste ano não foi exatamente uma surpresa. A escolha das ondas gravitacio­nais para o Nobel de Física foi a principal aposta de cientistas brasileiro­s que participar­am do “bolão” promovido pela Folha. Dos 14 palpites recebidos, 11 apontavam a detecção do fenômeno como a favorita para levar a honraria.

O detector utilizado, o Ligo, começou a ser concebido no início dos anos 1990 e constitui uma das maiores realizaçõe­s tecnológic­as da história. Sua sensibilid­ade extraordin­ária permite medir oscilações no espaço-tempo causadas por ondas gravita- Ele consiste em duas instalaçõe­s idênticas localizada­s nos Estados de Washington e da Louisiana, nos EUA

Rainer Weiss, 85

Desenvolve­u a tecnologia de laser utilizada no Ligo para a detecção das ondas gravitacio­nais cionais da ordem de um décimo de milésimo do diâmetro de um próton, uma partícula subatômica invisível ao mais potente microscópi­o.

“O Ligo é a régua mais precisa que a humanidade já construiu”, resume Sturani.

Os vencedores de 2017 dividirão um prêmio de 9 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 3,5 milhões). Weiss ficará com metade do dinheiro, enquanto Thorne e Barish dividirão a outra metade. OUVIR O UNIVERSO A capacidade do Ligo de captar as ondas gravitacio­nais abriu um novo mundo para a astronomia. “Ele permite observar o Universo de uma outra forma, diferente da proporcion­ada por ondas eletromagn­éticas, neutrinos ou raios cósmicos”, diz o físico Odylio Aguiar, pesquisado­r do Inpe (Instituto Nacional 4 km de Pesquisas Espaciais) e que também integra a colaboraçã­o Ligo.

“Dois buracos negros orbitando um em torno do outro, por exemplo, não produzem ondas eletromagn­éticas ou partículas que pudessem ser detectadas. Só conseguimo­s observar eventos como esse no canal das ondas gravitacio­nais”, diz o cientista.

Quando do anúncio da detecção, em 2016, Kip Thorne disse que antes nós apenas víamos o Universo; agora, começamos a ouvi-lo.

Sturani se vale de outra imagem. “É como se até hoje só tivéssemos visto filmes mudos do Universo e agora passássemo­s também a assisti-los com som. É como ter um novo sentido”, diz.

As duas equipes brasileira­s que integram a colaboraçã­o Ligo têm papéis distintos. O trabalho de Sturani é voltado para a análise e modelagem dos sinais captados, ao passo que o de Aguiar, mais experiment­al, é direcionad­o para o desenvolvi­mento de melhorias instrument­ais do observatór­io.

De acordo com Aguiar, além dos três observatór­ios de ondas gravitacio­nais hoje existentes (dois nos EUA e um na Itália), nos próximos anos devem ser inaugurado­s um no Japão e outro na Índia. “Em breve teremos cinco interferôm­etros supersensí­veis, que formarão uma rede”, diz.

“Estamos somente no começo dessa nova jornada pelo Universo”, conclui o pesquisado­r do Inpe. QUARTA (4) Nobel de Química QUINTA (5) Nobel de Literatura SEXTA (6) Nobel da Paz SEGUNDA (9) Prêmio de Ciências Econômicas O laser é lançado no interferôm­etro A luz é dividida em duas e enviada por túneis idênticos e perpendicu­lares de 4 km No encontro dos feixes, eles se anulam. Mas qualquer minúscula variação no compriment­o físico de um dos braços, provocada por uma onda gravitacio­nal, gera um desalinham­ento entre os lasers dos dois braços e indicaria a passagem da onda

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Ligo
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