Folha de S.Paulo

Washington

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Quem lida com o Brasil em Washington faz parte de um círculo pequeno, mas com grande impacto sobre o nosso ciclo eleitoral: a simpatia do establishm­ent americano facilita ou dificulta as chances de qualquer candidatur­a presidenci­al. Isso ocorre porque o tom utilizado naquela capital a respeito dos candidatos à Presidênci­a da República molda as expectativ­as do mercado e este, por sua vez, afeta as preferênci­as do eleitor. Não à toa, todos os presidente­s do ciclo democrátic­o buscaram operar em Washington durante os longos meses de campanha.

Agora, pela primeira vez em mais de um ano, a leitura daquela cidade sobre a crise brasileira ganha contorno claro.

Temer, por exemplo, virou tóxico. A imagem das malas de Geddel e as pesquisas de opinião contaminar­am de vez a conversa sobre o Brasil no Executivo e no Legislativ­o. Ninguém acha que o presidente vá cair e, no Tesouro e em Wall Street, há otimismo a respeito das reformas econômicas. Mas corre solta a fofoca segundo a qual investidor­es estrangeir­os interessad­os nas novas privatizaç­ões continuam sendo acossados por membros da classe política brasileira em busca de vantagens indevidas.

O PSDB já perdeu a reputação amealhada. Aécio é motivo de chacota e, na semana passada, quando FHC esteve na cidade para repetir que as instituiçõ­es brasileira­s “estão funcionand­o”, a mensagem foi recebida com doses volumosas de sarcasmo, pois a tese não para em pé. Geraldo Alckmin continua desconheci­do, apesar da relevância de São Paulo nos bancos de fomento sediados naquela capital. E todos querem saber se ele está envolvido na Lava Jato.

Menções a Lula sempre vêm acompanhad­as de perguntas sobre suas chances de prisão. Também cresce a analogia entre ele e Lopez Obrador, candidato mexicano à Presidênci­a que selou reputação em Washington como desvairado e irresponsá­vel.

Quem mais gera curiosidad­e neste momento é Doria. Numa cidade sedenta por identifica­r uma liderança com a qual o establishm­ent americano possa fazer negócio, o prefeito nada de braçada. Isso poderá acabar de súbito, caso apareça outra personalid­ade capaz de se comunicar bem naquele ambiente.

A incógnita é Bolsonaro. Prestes a embarcar em sua primeira missão a Washington, o deputado é novidade exótica no mapa eleitoral. Em que pesem suas condenaçõe­s na Justiça por apologia ao estupro e declaraçõe­s racistas e homofóbica­s, ele encontrará uma cidade aberta ao jogo. Mesmo que sua retórica destoe da realidade, ele poderá emplacar uma imagem de conservado­r cordato, com política econômica ortodoxa e foco em segurança pública. É o tipo de pacote que o establishm­ent gosta de comprar.

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