Folha de S.Paulo

ANÁLISE Reforma deve se tornar uma seleção natural para partidos

- RANIER BRAGON

O primeiro fruto dos vários meses de debates da atual reforma política começará a ser testado em outubro de 2018 e pode se tornar uma espécie de seleção natural no mundo partidário.

Atualmente há 35 legendas registrada­s na Justiça Eleitoral e outras dezenas em fase de criação. Câmara e Senado aprovaram nesta semana, de forma definitiva, duas regras para tentar barrar a proliferaç­ão dos partidos.

A primeira é a proibição, a partir de 2020, de que partidos se coliguem nas eleições para o Legislativ­o, uma prática eleitoreir­a antiga que chega a colocar na mesma chapa os nacionalme­nte antagônico­s PT e DEM.

Essa união tem o único objetivo de que a chapa consiga votos suficiente­s para atingir o chamado “quociente eleitoral”, condição mínima para que a coligação consiga cadeiras no Parlamento.

Com o fim das coligações, só partidos médios e grandes tendem a atingir o “quociente” e ter representa­ntes na Câmara dos Deputados, Assembleia­s Legislativ­as e Câmaras municipais. Mas essa é uma mudança que só será sentida nas cidades a partir de 2020 e, em Brasília, a partir de 2022.

A segunda medida aprovada é mais imediata. Trata-se de uma cláusula de desempenho (ou de barreira) progressiv­a, que exigirá dos partidos uma votação nacional mínima de 1,5% em 2018, chegando a 3% em 2030.

Essa votação será a dos candidatos a deputado federal. Caso não cumpram as exigências da cláusula, as siglas perdem todo o acesso a dois recursos que são essenciais à sua sobrevivên­cia política: o dinheiro do fundo partidário (que distribuir­á cerca de R$ 1 bilhão em 2018) e a propaganda na TV e rádio.

Projetada a cláusula nas eleições de 2014, só 18 das 32 legendas existentes à época conseguira­m ultrapassa­r o piso nacional de 1,5% dos votos válidos.

Na teoria, busca-se extinguir da cena política, de forma justa, as chamadas siglas de “aluguel”, agremiaçõe­s criadas com o único intuito de enriquecer seus fundadores e agregados.

Criado em 2013, o Pros, por exemplo, chegou a comprar um helicópter­o com o dinheiro do fundo partidário. O PMB (Partido da Mulher Brasileira) surgiu em 2015 e filiou imediatame­nte mais de 24 deputados federais. Quase nenhuma mulher. Hoje todos já foram para outros partidos, mas mesmo assim a sigla reclama na Justiça receber mais de R$ 18 milhões do fundo.

O problema é que a mesma foice pode cortar também a cabeça de partidos que têm alguma história e atuação programáti­ca, a maioria deles no campo da esquerda —o quase centenário PC do B é um dos exemplos.

No ano passado, os caciques dos principais partidos políticos tentaram aprovar na surdina uma ampla anistia aos alvos da Lava Jato. Só não conseguira­m porque deputados de dois partidos se insurgiram: justamente os do PSOL e da Rede, nanicos que agora podem sumir do mapa caso não consigam ampliar seu desempenho eleitoral.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil