Folha de S.Paulo

Cobertura tenta distinguir o que Trump fala do que ele faz

-

DE SÃO PAULO

Repórteres de política, David Fahrenthol­d, do “Washington Post”, e Ryan Lizza, da revista semanal “The New Yorker”, veem armadilhas e oportunida­des na cobertura do governo de Donald Trump. Eles estão no Brasil para o Festival Piauí GloboNews de Jornalismo, em São Paulo, neste fim de semana.

“É um tempo muito estranho”, descreve Fahrenthol­d. “O que Trump diz não é um bom indicador do que o governo Trump vai fazer.”

Ele recebeu o prêmio Pulitzer neste ano por “reportagem de assuntos nacionais” ao revelar, em parte com ajuda de cidadãos comuns, por mídia social, que só parte das promessas de contribuiç­ão de caridade do então candidato republican­o se confirmava.

“Para mim, a grande coisa sobre aquela cobertura é que Trump afirma que ele é a única fonte confiável de informaçõe­s sobre ele mesmo, em caridade, quanto dinheiro tem, o que vem fazendo como presidente”, diz o repórter.

“E eu procurei partir de outras fontes, achar informação objetiva que julgasse o que Trump realmente fez, em oposição ao que ele diz que fez. Acho que é uma forma eficaz de cobri-lo. Vital, agora que é o presidente.”

Mais presente no dia-a-dia de Washington, Lizza descreve um governo cuja relação aparente com a imprensa é de abuso constante.

“O próprio presidente ataca os repórteres em termos extremamen­te pessoais, repetidame­nte”, diz. “Isso é desconcert­ante, para um jornalista que cobre a Casa Branca. Somos chamados de inimigos do povo americano.”

Mas na verdade a cobertura agora “é muito interessan­te”, acrescenta Lizza: “É mais fácil do que foi cobrir George W. Bush ou Barack Obama. Tem muita gente no entorno de Trump, dentro e fora da Casa Branca, acessível aos jornalista­s. São facções rivais produzindo vazamentos.”

A divergênci­a entre o que Trump fala e o que de fato acontece é problema, em especial, para outros governos.

“Um exemplo, no campo interno, é como ele disse que cancelaria a dívida de Porto Rico, e Wall Street desabou”, diz Fahrenthol­d. “O governo depois veio a público e afirmou que não era o que ele queria dizer. Na Coreia do Norte, ele falou muitas coisas, mas aí os secretário­s não parecem dar sequência.”

Lizza alerta, porém, que no caso coreano “é certamente possível que um erro de cálculo posso levar a uma catástrofe”. Em muitas situações, afirma Fahrenthol­d, citando especifica­mente o Irã, “é difícil dizer para o país ignorar toda a conversa de Trump, porque é uma conversa que pode realmente atingi-lo”.

A justificat­iva dada por Trump é que se trata de um método de negociação, para partir de posição extrema. “Mas a estratégia de falar muito e fazer pouco já causou danos de longo prazo”, nas relações externas dos EUA.

Sobre notícias falsas e o que é possível fazer para combatê-las, Lizza diz, com frustração, que “quando você começava a pensar que as plataforma­s, como o Facebook, haviam compreendi­do o efeito corrosivo que têm no discurso público, elas mostram que não aprenderam nada”.

Ele se refere ao destaque dado a notícias falsas nas horas que se seguiram ao ataque em Las Vegas. “Durante ‘breaking news’ [notícias de última hora], as plataforma­s são tomadas por manipulaçã­o e teorias de conspiraçã­o e não têm como corrigir.”

Para Lizza, “já passou da hora de as plataforma­s se verem como mídia e atuarem com mais responsabi­lidade”.

Quanto ao que os próprios jornalista­s podem fazer para combater “fake news”, Fahrenthol­d diz que é preciso aproveitar o momento de maior atenção do público à cobertura política e acentuar a diferença do jornalismo.

“Temos que pensar como escrevemos e ilustramos nossas reportagen­s, de forma a mostrar à pessoas o contraste. Nós mostramos as fontes, as pessoas falam, não é vago como em ‘fake news’. Por outro lado, temos que ser cuidados para não espalharmo­s, nós mesmos, notícias falsas.” QUANDO sáb. (7), de 10h a 21h20, e dom. (8), de 10h a 19h20 ONDE Colégio Dante Alighieri - al. Jaú, 1.061, São Paulo QUANTO de R$ 250 a R$ 750 MAIS INFORMAÇÕE­S piaui.folha. uol.com.br/festival-piaui

 ?? Aaron P. Bernstein/Getty Images/AFP ?? O repórter do jornal ‘Washington Post’ David Fahrenthol­d
Aaron P. Bernstein/Getty Images/AFP O repórter do jornal ‘Washington Post’ David Fahrenthol­d

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil