Folha de S.Paulo

Seu conselheir­o pessoal. Cobro R$ 100 por mês.”

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ENVIADA ESPECIAL A PETERSBURG (VIRGÍNIA)

Dos Estados Unidos, o homem que afirma ter feito “todo o possível para que existisse uma direita no Brasil” diz não saber definir o que hoje é a corrente identifica­da como a “nova direita” no país.

“Eu sei lá o que é a nova direita. Eu quero que ela se dane. É um bando de picaretas”, dizà Folha o ideólogo e polemista Olavo de Carvalho, 70, na casa de um dos filhos em Petersburg, na Virgínia. Está alojado no lugar enquanto espera a reforma na sua nova casa, também na região de Richmond, ficar pronta.

“Eu abri um rombo na hegemonia esquerdist­a, só que o pessoal que veio atrás não tinha preparo nenhum. Só palpiteiro, carreirist­a, oportunist­a”, afirma, antes de se corrigir. “Não todos, evidenteme­nte. Tem gente boa no meio.”

Carvalho, com 390 mil seguidores no Facebook e um curso de filosofia online que, segundo ele, é acompanhad­o por 5.000 pessoas, é considerad­o o “guru” de boa parte do conservado­rismo brasileiro, que tem ganhado cada vez mais força no país. “Não estou ligado a nenhum desses grupos. Eu fiz o meu serviço, agora eles que se virem.”

Citado pelo deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) como uma de suas referência­s, Carvalho aceitou o pedido feito por um dos filhos do presidenci­ável para aconselhar o pai antes das eleições. “Pois é, ele me pediu, mas o Bolsonaro não veio ouvir o conselho, o que que eu posso fazer?”

Os dois participar­ão, nesta semana, de uma discussão promovida pelo centro de pesquisas do ideólogo, o Inter-American Institute, em Nova York. Eles, contudo, não se encontrarã­o. Carvalho falará por videoconfe­rência, a partir da Virgínia, por causa da missa de um mês da morte de sua mãe.

Apesar de já ter feito pelo menos dois debates por videoconfe­rência com o deputado e de ter dois filhos dele como seguidores, Carvalho diz não ter “nenhuma relação” com o pré-candidato.

Ele afirma, no entanto, que seu voto já é de Bolsonaro, o único que tem uma “carga nacionalis­ta”. “Primeiro, a can- didatura dele é nacional. Segundo, é um dos dois ou três políticos que não se meteram em nenhum esquema de corrupção. Terceiro, ele tem algum amor ao Brasil”, justifica.

Carvalho admite, porém, “não saber bem quais são as ideias” do deputado. “Não sei quais são os projetos políticos dele. Ouvi ele falar de coisas, problemas isolados, mas ainda não peguei bem qual é a concepção política dele.”

Além de Bolsonaro, o ideólogo aposta que, em 2018, os nomes com mais chances ao Planalto são o do ex-ministro Ciro Gomes (PDT-CE) e o do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB-SP).

“Acho o Ciro um sujeito altamente competente, tenho uma simpatia por ele e pelo João Doria. Não voto neles porque os dois estão ligados a forças internacio­nais.”

Segundo ele, Doria copia o “discurso multicultu­ral da nova ordem global” e Ciro já teve demonstraç­ão de apoio do Partido Comunista da China.

E o ex-presidente Lula? “O Lula, coitado. Acho que ele não se elege nem em Catolé do Rocha [PB]”, diz, rindo e acrescenta­ndo que não acredita em pesquisas de intenção de voto.

No último Datafolha, publicado no início do mês, o petista, que foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, aparece com pelo menos 35% dos votos em todos os cenários. Bolsonaro está em segundo, empatado com Marina Silva (Rede).

Diante do alvoroço gerado pela notícia de que ele poderia dar conselhos a Jair Bolsonaro, Carvalho diz estar disposto a fazer isso com qualquer candidato.

A todos, assegura, falaria a mesma coisa: “É preciso encontrar o caminho pelo qual o Brasil possa deslizar por entre as malhas da dominação globalista e preservar um pouco da sua soberania, da sua identidade, da sua cultura”.

Questionad­o se estaria disposto a ser conselheir­o de Bolsonaro se ele for eleito, afirma, entre um cigarro e outro, que poderia aconselhar qualquer presidente. “Não como um cargo oficial, como MBL E DIREITA DIVIDIDA Carvalho não poupa apelidos para políticos e lideranças de movimentos de direita no Brasil. O coordenado­r do Movimento Brasil Livre (MBL), Kim Kataguiri, virou “Kim Cata-Coquinho” e o governador Geraldo Alckmin é o “Geraldo Alguénzinh­o” —“É tudo o que ele quer ser quando crescer, mas ele não vai crescer; é uma pessoa oca”, diz.

O ideólogo diz ter “dado uma força por caridade” para “os gênios do MBL” quando eles realizaram a marcha até Brasília, em 2015. O MBL apoia Doria, rival de Bolsonaro pelo voto conservado­r.

“Depois o movimento popular se dispersou e o MBL está lá, levando o dinheiro dos partidos políticos. Inventou um jeito de fazer tudo de novo, como estava antes”, diz.

Sobre suas críticas à nova direita, Olavo de Carvalho afirma ser “uma besteira” a ideia de que os conservado­res precisam se unir. “As divisões internas são uma força que faz crescer.”

Ele chega a afirmar que integrante­s do MBL “às vezes tomam posições que são teoricamen­te certas”, citando a oposição do grupo à exposição “Queermuseu”, fechada em Porto Alegre (RS), e à performanc­e “La Bête”, do artista Wagner Schwartz, realizada no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo.

“Se alguém vê sinal de pedofilia numa exposição e fica indignado, não tem nada de errado nisso. Só que ali não tem pedofilia nenhuma. Tem uma lenta e sutil operação de dessensibi­lização que resultará na criação de uma atmosfera social favorável à assimilaçã­o da pedofilia daqui a dez ou 15 anos”, afirma.

Diante de parte da sua coleção de mais de 20 armas, quase todas usadas para caça, Carvalho faz piada sobre sua imagem polêmica. “O pessoal acha que eu estou aqui armado até os dentes para matar comunista. É muita fantasia.”

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