Folha de S.Paulo

Ameaças rondam separação da Catalunha

Oposição ao movimento independen­tista ganha força dentro e fora da Espanha; França não reconhece secessão

- DIOGO BERCITO

Presidente da região, que discursa ao Parlamento local, pode optar por declaração apenas simbólica

O presidente catalão, Carles Puigdemont, discursa nesta terça-feira (10) ao Parlamento regional, sediado em Barcelona, no clímax da crise espanhola.

Ele pode aproveitar sua fala às 18h locais (13h em Brasília) para declarar a independên­cia da Catalunha. Mas se o fizer, corre o risco de obter resultado oposto ao desejado: o governo central em Madri pode revogar temporaria­mente a autonomia parcial da região. Ele próprio periga ser detido.

A declaração seria o resultado do plebiscito separatist­a de 1º de outubro, em que 90% dos eleitores votaram “sim” —ainda que apenas 43% deles tenham participad­o da consulta, uma porcentage­m baixa que levanta dúvidas sobre sua validade.

Madri considera que o plebiscito foi ilegal porque contraria a lei espanhola, segundo a qual uma consulta nesses moldes teria de ser convocada pelo governo central e realizada em todo o território nacional.

Com as derrotas sofridas nos últimos dias, porém, é possível que Puigdemont escolha um caminho menos dramático do que a separação unilateral. A legislador­a Marta Pascal, sua aliada, sugeriu em entrevista à rede britânica BBC que ele pode optar por uma “declaração simbólica”.

O desafio, quer Puigdemont declare a independên­cia, quer não, será lidar com a pressão popular de ambos os lados. Há grandes contingent­es de catalães e de espanhóis favoráveis e contrários a essa independên­cia.

Madri foi tomada nas últimas semanas por uma infestação de bandeiras espanholas, em sinal de apoio à unidade territoria­l. Já Barcelona se enfeita com a sua “senyera”, o estandarte catalão com faixas amarelas e vermelhas.

O governo central espanhol não vai reconhecer nenhuma declaração unilateral de independên­cia. SUSPENSÃO O premiê conservado­r, Mariano Rajoy, do PP (Partido Popular), cogita responder acionando o Artigo 155, que prevê a suspensão temporária da autonomia catalã.

Com essa ferramenta, ele poderia forçar a região a antecipar suas eleições locais, desmontand­o o aparato separatist­a. O problema é que o artigo nunca foi usado, e tal gesto é considerad­o demasiadam­ente duro.

O governo precisaria da maioria absoluta do Senado para usar esse instrument­o — em teoria, consideran­do-se seus assentos, ele já a detém.

A Catalunha já goza de uma série de liberdades, como a permissão para ter seu próprio Parlamento e sua própria polícia. Nos últimos anos, uma sucessão de vitórias políticas deu força a partidos separatist­as, que aceleraram o projeto de independên­cia.

Os entusiasta­s da ideia invocam uma série de argumentos, desde culturais até econômicos. Catalães falam uma língua própria e respondem por 20% do PIB espanhol, que é hoje de US$ 1,2 trilhão (R$ 3,8 trilhões).

Mas esses planos sofreram mais um duro golpe na segunda-feira (9), com a declaração da França de que não aceitará uma eventual proclamaçã­o de independên­cia da região.

Em entrevista ao canal CNews, a ministra francesa das Relações Exteriores, Nathalie Loiseau, disse que uma separação da Catalunha não seria reconhecid­a. “A primeira consequênc­ia automática seria sua saída da União Europeia”, afirmou.

A negativa francesa sinaliza que, caso o governo catalão siga adiante e se declare independen­te, ficará isolado e sofrerá pressão permanente de influentes atores externos. A própria UE já indicou que não reconhecer­ia a separação catalã.

A falta de apoio internacio­nal é apenas um dos obstáculos ao projeto de secessão. A debandada de bancos e empresas da Catalunha na última semana acendeu outro sinal amarelo.

O banco catalão Sabadell, transferiu sua sede a Alicante. O CaixaBank, terceiro maior da Espanha, se mudou para Valência. Gigantes como a Gas Natural também deixaram a Catalunha.

A mensagem aos investidor­es é firme e afeta a simpatia popular pela causa da independên­cia da região.

As transferên­cias de sede significam que essas empresas estarão sujeitas a legislação e regimes fiscais vigentes em seus municípios de adoção. Não quer dizer que as estruturas físicas ou os empregados serão deslocados, necessaria­mente.

 ?? Jorge Guerrero/AFP ?? Em Barcelona, partidário da independên­cia segura cartaz em que se lê ‘sim, sou catalão; a Catalunha é uma nação oprimida’
Jorge Guerrero/AFP Em Barcelona, partidário da independên­cia segura cartaz em que se lê ‘sim, sou catalão; a Catalunha é uma nação oprimida’

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