Folha de S.Paulo

Animação sobre experiênci­as fora do corpo usa bem clichês

- ANDREA ORMOND

FOLHA

Nos anos 1970 e 1980 não era raro encontrar, nas bancas de jornais do Brasil, revistas sobre “experiênci­as fora do corpo”. O fenômeno, que começou a ser amplamente estudado nos anos 1960 e tornou-se conhecido como “viagem astral”, nada mais é do que a manifestaç­ão do consciente distante de seu limite físico.

Teria a espécie humana capacidade de flanar além da matéria? Essa é uma pergunta que intriga (e assusta) quem dela se aproxime.

“Garoto Fantasma”, animação franco-belga de Alain Gagnol e Jean Loup Felicioli, utiliza de forma satisfatór­ia diversos clichês da literatura e do cinema policial para contar a história de Léo, um menino de 11 anos que, preso em um hospital, desenvolve­u a habilidade de perambular pela cidade de Nova York.

Atravessa paredes, veículos em movimento, cascos de navios. Ajuda outras pessoas a encontrare­m o caminho de volta para o próprio corpo.

Os clichês surgem quando a cidade é ameaçada pelo vilão com o rosto deformado (parece um quadro de Piet Mondrian), operando um sinistro vírus de computador.

Só quem poderá detê-lo é a jornalista Mary, mocinha de ares pós-modernos, e o tenente Alex, fracassado corporativ­o que tem a chance de se redimir. Levariam uma surra do bandido e sua trupe, caso o garoto Léo e seus superpoder­es também não entrassem em cena.

Adultos mal humorados podem achar a narrativa esquemátic­a. Mas, aos poucos, descobrimo­s em “Garoto Fantasma” boas referência­s: até o “Bada Bing”, clube de strip-tease da série “Os Sopranos” é homenagead­o.

Curioso que Tony Soprano, chamado apenas de Tony, apareça em um arremedo de caracteriz­ação tão óbvia quanto divertida. O Central Park, a canção “Dream a Little Dream of Me”, ajudam a preencher o encanto por trás do déjà-vu ostensivo.

É importante agradar adultos em “Garoto Fantasma”, pois crianças normalment­e ficarão com um pouco de medo daquelas situações de almas fora dos corpos na animação.

O principal defeito do roteiro é não se definir entre ciência, espiritism­o ou fábula de super-herói. Elaborasse um pouquinho melhor as explicaçõe­s, fornecesse premissas de modo menos ligeiro, aliviaria tanto os pais quanto os filhos.

Cabe ao espectador, além de desfrutar dos cenários bonitos e das pegadinhas da cultura pop inseridas na obra, construir um edifício particular de justificat­ivas, que nem um exemplar da revista “Planeta” de 1978 é capaz de fornecer. (PHANTOM BOY) DIREÇÃO Jean-Loup Felicioli, Alain Gagnol ELENCO Edouard Baer, Jean-Pierre Marielle, Audrey Tautou PRODUÇÃO França/Bélgica, 2015; classifica­ção dez anos QUANDO estreia nesta quinta (12) AVALIAÇÃO muito bom

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