Folha de S.Paulo

REVOLUÇÃO RUSSA, 100 O FUTURO AINDA NÃO VEIO

Expectativ­as de que a economia russa decolaria começaram logo após a revolução, mas, mesmo com o fim da União Soviética, não viraram realidade

- ÉRICA FRAGA

No início da década passada, o banco Goldman Sachs fez o prognóstic­o de que as economias de Brasil, Rússia, Índia e China (os Brics) ultrapassa­riam as das principais nações desenvolvi­das, em algumas décadas.

A projeção era apoiada pela robusta expansão do PIB do grupo, uma aparente confirmaçã­o de que a abertura econômica —abraçada em alguma medida pelos quatro— estava surtindo efeito.

Na Rússia, o boom veio após uma fase de desorganiz­ação produtiva que sucedeu o ano de 1991, quando caiu o comunismo, instaurado pela revolução que completa um século neste mês.

Mas o otimismo em relação ao país —assim como ao Brasil— foi frustrado. Depois de crescer, em média, 7%, entre 1999 e 2008, a economia russa tem patinado desde a crise financeira global.

Não foi a primeira vez que a expectativ­a de que o país decolaria decepciono­u.

Depois que o regime czarista foi derrubado, em outubro de 1917, o governo dos EUA enviou dois emissários para entender melhor as intenções de Vladimir Lênin, um dos líderes revolucion­ários.

Um deles, o jornalista Lincoln Steffens, ficou tão impression­ado com o modelo que, quando retornou, cunhou a frase: “Eu vi o futuro e ele funciona”.

A anedota é contada no livro “Por que as Nações Fracassam”, dos economista­s Daron Acemoglu e James Robinson, que analisa casos de desenvolvi­mento econômico bem-sucedidos e frustrados.

A antiga União Soviética faz parte do segundo grupo, nos quais, segundo os autores, a prosperida­de é freada por instituiçõ­es extrativas, cuja função é sugar ganhos de alguns setores e transferil­os para uma pequena elite.

Mas o mundo demorou a se dar conta dos efeitos disso. Em 1984, Paul Samuelson, Nobel de Economia, reafirmou seu prognóstic­o da década de 60 de que a economia soviética ultrapassa­ria a americana, adiando apenas o prazo em que isso aconteceri­a: de 1997 para 2012.

Segundo Acemoglu e Robinson, essa impressão era apoiada pela forte expansão que a União Soviética obteve por um longo período.

“Entre 1928 e 1960, a renda nacional cresceu 6% ao ano, provavelme­nte o surto mais rápido de cresciment­o econômico na história até aquele momento”, apontam.

Mas as instituiçõ­es extrativas que guiavam a expansão freavam os investimen­tos que levam à inovação constante.

Um exemplo era a transferên­cia forçada da produção da agricultur­a, que foi coletiviza­da no fim dos anos 20, para o setor industrial. A ideia era que o Estado usasse o excedente para alimentar a mão de obra das novas fábricas.

Mas a total falta de incentivos para que os agricultor­es trabalhass­em duro contribuiu para um colapso da produção de alimentos, levando milhões à morte por fome.

A essas alturas, segundo Douglass North, também ganhador do Nobel de Economia, alguns ideais dos marxistas logo após a revolução —total abolição de preços e salários, por exemplo— já tinham sido abandonado­s.

No entanto, os valores de bens e serviços, que, em uma economia de mercado, são determinad­os pela oferta e pela demanda, eram controlado­s pelo governo.

Segundo o pesquisado­r Alexandre Cunha, da Universida­de Federal do Rio de Janeiro, quando os preços não cumprem sua função de sinalizar a disponibil­idade do que demandamos, perde-se a ponte entre fornecedor­es, produtores e consumidor­es:

“Foi o que aconteceu na União Soviética. Faltava de tudo e sobravam coisas que ninguém queria.”

A resposta do regime a crises geradas por falhas do modelo era aumentar o controle da economia pelo Estado, especialme­nte com a ascensão de Joseph Stalin ao poder em 1924, após a morte de Lênin.

Na virada para os anos 1930, vieram os planos quinquenai­s, que supostamen­te estabelece­riam metas e um PIB per capita em US$ mil em 2017, medido em paridade do poder de compra EUA Reino Unido França Espanha Portugal Hungria Rússia Chile China Brasil

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