Folha de S.Paulo

A Copa do Mundo resiste

- PAULO VINÍCIUS COELHO

O GOLEIRO Iker Casillas declarou logo depois da final da Liga dos Campeões de 2014, a terceira de sua carreira, que a conquista era tão grande quanto a Copa do Mundo de 2010, que ajudou a Espanha a ganhar: “Esperamos muitos anos pela Décima”, disse Casillas, em referência ao décimo título europeu do Real Madrid.

Gianluigi Buffon jamais ganhou a Liga. Considera a chance de conquistá-la uma glória igual à do Mundial de 2006, pela Itália. Medir emoções é impossível. É a era dos torneios milionário­s de clubes, mas muita gente se empolgou e demonstrou paixão por feitos de seleções nacionais na semana que terminou neste sábado (14).

A reta final das eliminatór­ias demonstra como a importânci­a da Copa do Mundo resiste. Ainda que pátria e futebol não caminhem sempre juntos, camisetas e bandeiras foram tiradas do armário para torcer por Messi, Cristiano Ronaldo, Insigne, Pogba e Neymar.

A primeira página do diário Clarín, na quarta (11) seguinte à vitória sobre o Equador, dizia: “O gênio de Messi nos colocou no Mundial.”

O verbo conjugado na primeira pessoa do plural: nós.

A angústia e apreensão pela possível ausência não foi exclusivid­ade argentina. “Se a Itália não for à Rússia será o Apocalypse Now. Ninguém liga para a seleção normalment­e, mas na hora da Copa todo mundo tem bandeira na janela”, diz o jornalista Enzo Palladini do canal italiano MediaSet, nascido e residente em Milão.

Aos poucos, a Itália afasta-se do centro do futebol mundial. Não ganha nenhum torneio europeu de clubes desde a Internazio­nale, de José Mourinho, em 2010, o primeiro campeão continenta­l sem nenhum titular nascido no país do clube. O treinador também era estrangeir­o.

Nas 14 competiçõe­s seguintes, Liga dos Campeões e Liga Europa somadas, os times da Espanha venceram nove, a Inglaterra três, Portugal e Alemanha uma vez cada. A elite do futebol está lá.

Mas são quatro países apenas. Só se vai jogar futebol de alto nível nesses quatro lugares?

As fronteiras se expandem pela televisão, mas limitam-se fisicament­e. Muita gente fora da Espanha torce por Real Madrid e Barcelona. Mas quem acompanha o Porto fora de Portugal? O Porto é um dos campeões continenta­is citados acima.

A Liga dos Campeões é uma competição espetacula­r.

Isto à parte, criam-se patriotas do Barcelona, nascidos na Rocinha.

Pode ser tão justo quanto um menino nascido em Manaus torcer pelo Flamengo, mas isto não significa que deva se tornar uma tendência e que não possa haver trabalho capaz de formar mais vascaínos e rubro-negros na Rocinha, mais corintiano­s e palmeirens­es em Heliópolis, do que barcelonis­tas e madridista­s no Rio e em São Paulo.

Também é legítimo discutir se é patriótico torcer pela seleção ou se é permitido apaixonar-se pela camiseta da Holanda, do Uruguai ou da Argentina. Injusto é atribuir regras. No mundo do politicame­nte correto, para muita gente parece ridículo quem torce pela seleção brasileira. Não é. Não se trata de patriotism­o. Trata-se de pertencime­nto. É por isso que italianos, argentinos e portuguese­s levam bandeiras à janela, como sempre fizemos no Brasil.

No mundo do politicame­nte correto, para muita gente parece ridículo quem torce pela seleção. Mas não é

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