Folha de S.Paulo

Exposição no Masp sobre sexualidad­e reforça que a intolerânc­ia é inaceitáve­l

Mostra que abre na sexta (20) reúne mais de 250 obras de artistas como Degas e Egon Schiele

- HEITOR MARTINS FABIO CYPRIANO FABIO CYPRIANO viajou a convite da Fundação para Cultura e Artes de Istambul (iKSV)

FOLHA

Sexo faz parte integral de nossas vidas; sem ele sequer existiríam­os. Por isso mesmo, a sexualidad­e, nas suas mais diversas manifestaç­ões, tem desde sempre ocupado um lugar central no imaginário coletivo e na produção artística. “Histórias da Sexualidad­e”, exposição que o Masp abrirá na próxima sexta-feira (20) para o público, traz amplo recorte dessa produção, com o objetivo de promover um debate sério, maduro e inclusivo, cruzando temporalid­ades, suportes e geografias.

A presente exposição é fruto de intenso trabalho em torno das várias histórias que o Brasil tem para contar.

Em 2016 inauguramo­s “Histórias da Infância”, e nos últimos dois anos viemos trabalhand­o no atual projeto que foi antecedido por dois seminários internacio­nais sobre essas questões e que contou com a participaç­ão de especialis­tas e do público geral.

A exposição também se insere no contexto mais amplo da programaçã­o do museu, que neste ano vem tratando do tema da sexualidad­e com mostras de Toulouse-Lautrec, Miguel Rio Branco, Teresinha Soares, Wanda Pimentel, Tunga, Guerrilla Girls, Pedro Correa de Araújo e Tracey Moffat.

“Histórias da Sexualidad­e” inclui mais de 250 obras, reunidas em núcleos temáticos e não cronológic­os, sendo muitas delas pinturas fundamenta­is de nossoacerv­o:Degas,Manet,Ingres, Poussin, Picasso, Gauguin, Renoir, Perugino, Suzanne Valadon, Victor Meirelles.

Também traz trabalhos de artistas como Adriana Varejão, Ana Mendieta, Balthus, Egon Schiele, Francis Bacon, Jac Leirner, Mapplethor­pe, Louise Bourgeois, Marta Minujin, Valie Export e Rego Monteiro.

Ainda que concebida em 2015, “Histórias da Sexualidad­e” não poderia ser mais atual. Episódios recentes, não só no Brasil mas em todo o mundo, trouxeram à tona —por meio de embates públicos, protestos e violentas manifestaç­ões nas mídias sociais— questões relativas à sexualidad­e e acerca dos limites entre direitos individuai­s e liberdade de expressão.

Não existem verdades absolutas. As fronteiras do que é moralmente aceitável deslocam-se a toda hora e no decorrer da história.

Esculturas clássicas, hoje considerad­as símbolos da arte europeia, não poucas vezes tiveram seus sexos tapados por folhas de parreira e outros subterfúgi­os. Também os costumes variam entre culturas e civilizaçõ­es.

Em várias nações europeias, a nudez é exposta em parques, praias e lugares públicos; a poligamia é aceita em países islâmicos; prostituiç­ão é prática legal em algumas nações e condenada em outras; há países onde o aborto é livre e outros onde não é. Até mesmo amento da liberdade de expressão, não devem e não podem ser aceitos. O Masp, um museu diverso, inclusivo e plural, tem por missão estabelece­r, de maneira crítica e criativa, diálogos entre passado e presente, culturas e território­s, a partir das artes visuais.

“Histórias de Sexualidad­e” objetiva justamente promover, por meio da arte, um debate consistent­e e sólido a partir de um número muito significat­ivo de obras —arte pré-colombiana, asiática, africana, europeia e latino-americana, pinturas e esculturas, vídeos e fotografia­s, assim como documentos e publicaçõe­s – que fazem parte deste catálogo de nuanças e diferenças, mas também de tudo que nos une e nos faz, cada um à sua maneira, humanos. HEITOR MARTINS

ENVIADO ESPECIAL A ISTAMBUL

“Para onde vamos a partir daqui?” A pergunta em formato de arco-íris, obra do artista suíço Ugo Rondinone, e instalada na fachada do centro cultural Mustafa Kemal, sintetiza questão essencial da 15ª Bienal de Istambul: o que se pode fazer em tempos obscuros?

A peça foi vista na sexta edição da mostra, em 1999, na praça Taksim, que se tornou palco de manifestaç­ões da turbulenta Turquia. Agora, com dezenas de jornalista­s presos e acadêmicos afastados, qual o sentido de uma bienal em um contexto onde falta liberdade de expressão?

A dupla de artistas dinamarque­ses Elmgreen & Dragset, curadora desta edição aberta até 12/11, optou por uma mostra que evita uma abordagem documental do momento, mas mostra de forma sutil dificuldad­es do presente, a começar pelo título.

“a good neighbour”(um bom vizinho) não tem início com letra maiúscula, portanto pertence a uma frase maior, que pode ser imaginada pelo visitante. Aconvivênc­ia se torna uma questão central da mostra, como já ocorreu na 27ª Bienal de São Paulo, em 2006, “Como Viver Junto”.

Sem sede permanente, Istambul ocorre a cada edição em distintos espaços. Desta vez, são cinco instituiçõ­es, como o museu Istanbul Modern, e obras instaladas em espaços públicos, como a de Rondinone. No total, foram selecionad­os 56 artistas de 32 países.

Único brasileiro na Bienal, Victor Leguy é visto no Istanbul Modern com a instalação “Estruturas para Fronteiras Invisíveis”, série iniciada em São Paulo sobre migração e que teve sequência na Turquia. Ele expõe objetos recolhidos com migrantes ou refugiados, a partir de trocas, quando ele próprio entrega aos participan­tes objetos pessoais. Surge uma ética de contato, e não mera apropriaçã­o.

Muitas obras na mostra evitam, de fato, críticas contundent­es, mas a sutileza às vezes é mais óbvia, como na instalação da turca Candeger Furtun, que exibe pernas claramente masculinas em posição sentada, como a indicar o machismo da sociedade turca.

Menos militante que a Documenta de Kassel, Istambul privilegia a abordagem poética em uma sociedade marcada pelo autoritari­smo. AVALIAÇÃO ótimo

 ??  ?? Acima, ‘New Years Day’, xilogravur­a sobre papel de Eisen de 1835; ao lado, obra sem título do artista José Antonio da Silva, datada de 1971
Acima, ‘New Years Day’, xilogravur­a sobre papel de Eisen de 1835; ao lado, obra sem título do artista José Antonio da Silva, datada de 1971

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