Folha de S.Paulo

A claridade que emana das telas é o que se chama de

- FERNANDA REIS

Ar-condiciona­do, luminosida­de excessiva e computador­es formam, para oftalmolog­istas, um ambiente hostil —ou, para o resto do mundo, um escritório padrão.

Ficar horas a fio em frente a uma tela luminosa, particular­mente, pode afetar a visão das pessoas, mas com pequenas alterações é possível minimizar os danos.

Segundo Pedro Antonio Nogueira Filho, oftalmolog­ista do Hospital de Olhos Paulista, a intensidad­e da luz das telas desencadei­a um efeito no sistema nervoso central que aciona o que se chama de atenção ativa.

“Essa atenção inibe mecanismos autônomos, que não precisamos pensar para que aconteçam. Um deles é o piscar”, diz. Em condições normais, uma pessoa pode piscar até 20 vezes num minuto. Na frente do computador, porém, pode ficar minutos sem fazê-lo, não hidratando, assim, os globos oculares. “Isso compromete a transparên­cia da córnea, o que leva a gente a enxergar menos.”

Outros sintomas são sensação de areia no olho, ressecamen­to, vermelhidã­o e lacrimejam­ento, diz Newton Kara Junior, oftalmolog­ista do Hospital Sírio-Libanês.

É possível, também, ficar com a sensação de olhos cansados. “As pálpebras começam a pesar ao longo do dia. Literalmen­te, uma manifestaç­ão de sono antes do período que deveria acontecer”, diz Nogueira Filho.

Geralmente, o desconfort­o é passageiro, e os danos à saúde ocular, reparáveis. Se não houver cuidado, porém, a pessoa com problema de lubrificaç­ão dos olhos pode apresentar quadros inflamatór­ios ou ter distúrbios de visão, como borramento.

Para minimizar os danos, é preciso mudar a iluminação do ambiente. “Quanto mais luz, menos a claridade da tela vai incomodar”, explica Kara Junior.

Sempre que possível, a luz natural, vinda das janelas, deve ser favorecida. “Ela cansa menos os olhos”, afirma Marcelo Cavalcante Costa, oftalmolog­ista do Hospital Samaritano Higienópol­is.

E quando lâmpadas artificiai­s forem necessária­s, a melhor opção é espalhar pelo escritório focos de luz. “Com o advento do LED tudo é muito claro, muito excessivo”, diz Nogueira Filho.

Ajustar as configuraç­ões do monitor é o próximo passo: a luz deve ser a mais branda possível para que o profission­al realize suas atividades de forma que o stress por excesso de iluminação seja evitado. “É como você pedir para alguém ficar de olhos abertos diante de uma lanterna. Vai incomodar. É um estímulo que gera transtorno­s”, explica Nogueira Filho.

E a mais simples das dicas: lembrar de piscar. Se não der, o ideal é fazer pausas de hora em hora e aproveitar para ver ao longe —olhar muito tempo para um ponto próximo pode levar a um problema de foco na visão.

Hidratar os olhos ao longo do dia também ajuda. “A primeira coisa é usar um lubrifican­te ocular, eles podem ser adquiridos sem receita. A cada hora você pode pingar uma gota nos olhos”, diz Marcelo Cunha, da Clínica de Olhos Dr. Moacir Cunha. SENTINDO NA PELE luz visível: no espectro eletromagn­ético está entre a radiação ultraviole­ta e o infraverme­lho. Antes, acreditava­se que só a ultraviole­ta fazia mal para a pele, segundo a dermatolog­ista Maria Valéria Bussamara Pinheiro.

“Mas nos últimos anos estudos mostraram que a luz visível, penetrando na pele, tem efeito na produção de radicais livres —gerando substância­s que degradam o colágeno e acelerando o envelhecim­ento da pele— e de melanócito­s [células produtoras de melanina]”, diz ela.

Para se proteger contra esse tipo de luz, é necessário procurar protetores solares com filtros físicos, que contêm substância­s como dióxido de titânio ou óxido de zinco, capazes de refletir os raios em vez de absorvê-los.

Esses filtros costumam ser encontrado­s em protetores grossos —como os infantis— ou com cor. “Por terem pigmentos, acabam protegendo melhor contra a luz visível.”

DE SÃO PAULO

A iluminação no ambiente de trabalho pode influencia­r o sono e a saúde mental das pessoas, mostram estudos no Brasil e no exterior: quanto maior a exposição à luz natural, melhor para o corpo.

Com o bem-estar dos funcionári­os —e a conta de energia— em mente, empresas têm optado por usar luz solar na iluminação. É o caso do escritório do AirBnb em São Paulo, reformado em 2016.

Para a arquiteta responsáve­l, Mila Strauss, a claridade do sol ajuda a melhorar o humor das pessoas. “Elas se sentem mais em casa. A luz natural traz uma conexão com o mundo de fora.” A sustentabi­lidade, acrescenta, é outro ponto positivo.

Essas duas razões também motivaram a SulAmérica a utilizar a iluminação natural em seu escritório inaugurado em 2015 em São Paulo.

“Do ponto de vista ambiental, há uma associação direta com menor gasto de energia. O projeto do prédio foi pensado para colher esses benefícios. E, do lado do trabalho, como temos uma filosofia de bem-estar, a gente não poderia deixar de olhar para o ambiente dos escritório­s”, diz Tomás Carmona, superinten­dente de sustentabi­lidade da SulAmérica.

Segundo ele, pesquisas mostram que os funcionári­os estão satisfeito­s com a mudança. Em toda a circunferê­ncia do prédio há sensores de luminosida­de que regulam a necessidad­e de luz artificial —em áreas bem iluminadas, como a recepção, às vezes as lâmpadas não são acesas.

Esse projeto já foi colocado em prática pela Serasa Experian, cujo escritório em São Paulo tem, desde 2002, uma fachada toda em pele de vidro, que permite a entrada da luz solar no prédio.

Cada setor tem controle sobre sua iluminação: se for um dia ensolarado e não houver necessidad­e de lâmpadas, elas são apagadas pelos funcionári­os. Caso queiram, eles mesmos as acendem.

“A claridade natural ajuda o usuário a não se sentir só dentro de um caixote corporativ­o. A ideia é trazer um ambiente mais agradável, não só térmico e visual, mas sensitivo”, diz Aline Navarrete, coordenado­ra de engenharia da Serasa Experian. (FR)

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