Folha de S.Paulo

Estátua em praça virou crônica que causou até prisão

- EDGAR SILVA

Quem passa pela praça Princesa Isabel nota um grande pedestal. Sobre ele um militar em cima de um cavalo, com uma espada para o alto. A reforma agora da praça pode ajudar a destacar a estátua e aguçar a curiosidad­e sobre a obra.

O militar ali retratado é Luís Alves de Lima e Silva, mais conhecido como Duque de Caxias, figura central do Exército brasileiro, seu patrono desde 1962. Os trabalhos para a construção do monumento começaram em 1942. A estátua foi construída no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, sendo concebida com pedestal de granito e bronze patinado.

O monumento talvez fosse só uma estátua como tantas outras pela cidade se, em 1977, Lourenço Diaféria, então colunista da Folha ,não o tivesse usado como analogia para contar a história de um bombeiro que saltou num poço de ariranhas, no zoológico de Brasília, para salvar um garoto de 14 anos.

Com o texto “Herói. Morto. Nós.”, Diaféria comentava o feito e a morte do sargento, que deixava quatro filhos e a mulher, mas que saltara para salvar um adolescent­e que “estava sendo dilacerado pelos bichos”. “Prefiro esse sargento herói ao duque de Caxias. O duque de Caxias é um homem a cavalo reduzido a uma estátua. (...) O povo está cansado de espadas e de cavalos. O povo urina nos heróis de pedestal”, escreveu o jornalista.

O texto, publicado em 1º de setembro de 1977, repercutiu mal entre os militares. No dia 15, Diaféria foi detido, em sua casa, pela Polícia Federal. No dia seguinte, a Folha publicou a coluna em branco na página 44, na Ilustrada, com um aviso de que a coluna diária de Diaféria não seria publicada em virtude de sua detenção.

O colunista permaneceu detido por cinco dias. Após a polêmica, Diaféria (19332008) voltou a escrever para o jornal. Ao todo, publicou 1.868 textos, entre colunas e reportagen­s assinadas, na Folha.

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