REVOLUÇÃO RUSSA, 100 Peças trazem olhar feminino do grotesco
Monólogo ‘K.I.’, do russo Daniel Gink, apoia-se em personagem do romance ‘Crime e Castigo’, de Fiódor Dostoiévski
‘A Guerra Não Tem Rosto de Mulher’, livro da bielorussa Svetlana Aleksiévitch, Nobel de Literatura, vira peça
Depois de cumprir seu “dever” de um casamento contra sua vontade, Kátierina Ivânovna, personagem do romance “Crime e Castigo”, de Dostoiévski, desabafa: “Eu me casei chorando e soluçando, mas eu me casei”.
Na peça “K.I.”, do russo Daniel Gink, Kátierina vira protagonista e fala da sua condição: integrante de uma família abastada, é abandonada e destituída de tudo por perseguir uma paixão que os familiares desaprovam.
O monólogo, que ganha encenação brasileira pela Cia. da Memória, inaugura um projeto do grupo chamado Pentalogia do Feminino, com encenação de cinco peças que trazem olhares de mulheres.
O trabalho se une a outro espetáculo, também em cartaz em São Paulo, no retrato do olhar feminino sobre a violência e o grotesco: “A Guerra Não Tem Rosto de Mulher” é a versão teatral do livro de Svetlana Aleksiévitch, em que a escritora bielorrusa, Nobel de Literatura, reúne relatos de mulheres soviéticas que lutaram na Segunda Guerra.
Marina Tenório, que dirige “K.I” ao lado de Ruy Cortez, diz que a ideia é rever a questão da mulher em diversos períodos e classes, ressaltando essas “personagens cindidas”.
“As mulheres pagavam um preço alto”, continua Ondina Cais, que atua no monólogo. “Ela [Kátierina] quer justiça, liberdade, essa busca louca.”
A “loucura” do discurso foi o que atraiu a atriz e produtora Carolyna Aguiar à obra de Aleksiévitch. Ela conheceu a bielorrussa na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) do ano passado e decidiu transformar o livro em peça.
A atriz conta que chamou a sua atenção “a resiliência dessas mulheres”, que trazem relatos como “a minha vontade de viver me salvou”; ou “antes tínhamos medo da morte, agora, da vida”.
Mas, para o diretor Marcello Bosschar, os relatos de guerra e morte são uma forma de “valorizar a vida”.