Folha de S.Paulo

Luz mais cara para evitar o pior

- VINICIUS T O RRES FREIRE

A CONTA DE luz vai subir mais em novembro, como previsto. Se não vier chuva e caso haja bom senso na administra­ção da economia e da eletricida­de, essa conta deveria ficar ainda mais cara. Pega mal dizer tal coisa, mas é a solução mais prudente.

Embora seja mero chute falar de racionamen­to antes de fevereiro, por aí, a situação dos lagos das hidrelétri­cas é crítica. É preciso poupar energia (e, pois, a água desses reservatór­ios). Para tanto, temos de usar mais da energia muito mais cara das termelétri­cas (que são uns geradores monstruoso­s movidos a óleo, biocombust­ível, gás ou carvão). Assim, o custo de produzir eletricida­de não vai, não deve nem pode cair tão cedo.

Na verdade, a energia já está mais cara, no atacado. O problema é saber quem paga a conta final.

Há uma conversa maluca no governo de dar uma “ajuda” às distribuid­oras (as empresas que nos vendem a energia), que dizem estar com as contas cada vez mais no vermelho, pois vendem energia a preço inferior ao que pagam. Se é o caso, como parece ser, passar essa conta para o governo é uma gambiarra velha, ineficient­e e injusta.

Se o custo subiu por motivos alheios à administra­ção das distribuid­oras de energia, deve aparecer na conta de quem consome eletricida­de, não na conta de todo mundo, na conta do governo, de resto quebradaço. Além de justo, é eficiente: preço mais alto incentiva a moderação no consumo de um serviço mais escasso.

Nesta terça (24), a Aneel elevou o valor extra que se paga pela energia em tempos de escassez. Isto é, ficou mais cara a bandeira vermelha nível 2, que havíamos passado a pagar neste mês. Em vez de R$ 3,50, o preço extra por 100 kWh consumidos será de R$ 5 a partir de novembro.

Para resumir uma complicaçã­o insana, grosso modo essa cobrança de bandeira vermelha paga parte do custo extra de produzir energia por meio de termelétri­cas. É o preço de poupar água dos lagos das hidrelétri­cas. O nível médio dos reservatór­ios no país está abaixo de 19%. No outubro do apagão de 2001, estava em 23%.

Entendidos dizem que o reajuste da bandeira vermelha ainda não cobre esse custo extra. Mas o método de cobrança melhorou. A decisão de ligar as termelétri­cas depende de chuvas, do nível dos lagos das hidrelétri­cas e de consumo. Agora, levará menos em conta as chuvas, incertas e voláteis; terá mais peso o nível dos reservatór­ios, que não varia tanto assim de mês a outro e é fator mais importante na decisão de como administra­r o sistema todo de modo prudente.

Vai demorar até os lagos voltarem a um nível mais seguro. Logo, as termelétri­cas ficarão ligadas por mais tempo. A encrenca é saber quanto mais se deve cobrar pela eletricida­de, para o consumidor final.

O país está menos sujeito a racionamen­to porque pode produzir energia por outras fontes, térmicas e ventos, o que não era o caso em 2001. Ainda assim, chuva importa. Se não fosse a crise, a situação seria ainda mais crítica. Mesmo as projeções de aumento de consumo de eletricida­de para este ano, 2%, vão ser frustradas (nos doze meses até agosto, o consumo nacional caiu, na verdade).

Caso a economia cresça, não chova e não se poupe a água dos reservatór­ios, vamos ter problema sério.

Apenas no Carnaval de 2018 vamos saber se choveu bastante para afastar risco de racionamen­to

vinicius.torres@grupofolha.com.br

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil