Folha de S.Paulo

Sonho de escola

- COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Leão Serva; FRANCISCO DAUDT terça: Vera Iaconelli; quarta: Francisco Daudt; quinta: Sérgio Rodrigues; sexta: Tati Bernardi; sábado: Oscar Vilhena Vieira; domingo: Antonio Prata

SÉRGIO BERNARDES, o arquiteto, respondia àqueles que reclamavam de seus projetos amalucados: “Eu sei que eles não vão ser realizados mesmo, deixa eu delirar”.

Pois é motivado por ver meu filho estudando como nunca (“Ah, agora que a escolarida­de acabou, eu posso estudar o que quero”), e por mais um massacre feito por aluno vítima de bullying, que me valho da licença de Bernardes para delirar meu sonho de escola.

Nela, seus ensinos principais seriam cidadania e economia doméstica, com matérias subordinad­as a esses aprendizad­os.

Sob o poder moderador da direção da escola, os alunos brincariam de aprender sobre democracia: a principal função do Estado (segurança pública com implementa­ção das leis); a razão de haver Três Poderes separados (permanente desconfian­ça de vocações tirânicas, cada um vigiando o outro); respeito ao contraditó­rio; as vantagens do Parlamento; a mediação de conflitos através do Judiciário (fim do bullying impune ou da vingança pelas próprias mãos); a busca das igualdades ambicionad­as pela democracia (de oportunida­des e perante às leis); aprenderia­m que o voto é a última instância decisória e só acontece depois de muito debate; liberdade de pensamento e de expressão (respeitada­s as proibições de injúrias, calúnias e difamações); liberdades em geral, se respeitada­s as leis; a função dos impostos e sua necessária ligação com os deveres do serviço público (“No taxation without representa­tion”).

A lista é intermináv­el, o que está aqui apenas abre o debate. Poderiam brincar de formar um parlamento, um Executivo e um Judiciário, experiment­ar a democracia representa­tiva.

No aprendizad­o de economia doméstica, a primeira lição seria: dinheiro não cai do céu (Milton Friedman, “não existe essa coisa de almoço grátis”). “Quais são meus custos; quais são meus ganhos”; diferença entre custo fixo e custo variável; entre gasto e investimen­to; relações custo/ benefício; poupança ligada a planejamen­to de médio e longo prazo; diferenças entre regimes econômicos (capitalism­o/ socialismo); relação entre regimes econômicos e regimes de governo.

Como se daria a transmissã­o de conteúdos? Aí vem uma parte que é o meu xodó: a santa tecnologia iria realizar uma aproximaçã­o do mais caro ideal da democracia, a igualdade de oportunida­des. Por meio de tablets e de tutoriais, os alunos de Quixeramob­im teriam também os melhores professore­s do país. A história e a geografia servindo ao aprendizad­o de cidadania; a matemática e a física, ao de economia doméstica (quem quisesse ir além dos juros e da regra de três, iria fazê-lo por interesse próprio, não por imposição); a língua portuguesa aprendida durante as respostas discursiva­s aos testes (haveria testes ao fim de cada aula no tablet, tanto discursiva­s quanto de múltipla escolha), num revisor de texto que mostrasse as impropried­ades da escrita.

Haveria grupos de estudos eletivos e obrigatóri­os, com monitores para ajudar, mas sobretudo para ensinar a estudar.

Finalmente, o recreio: aprendizad­o de ética na convivênci­a e no esporte.

Algo precisa mudar: a escola atual não prepara cidadãos éticos e independen­tes.

Nela, o ensino principal seria de cidadania e economia doméstica, com matérias subordinad­as

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