Folha de S.Paulo

Votação mostra base governista desorganiz­ada

Planalto sobreviveu porque soube usar a máquina para atrair parlamenta­res preocupado­s com a eleição de 2018

- BRUNO BOGHOSSIAN

Michel Temer transformo­u a estrutura do governo em uma máquina eleitoral para sobreviver no cargo.

Com ela, construiu uma ponte para atravessar os 14 meses que o separam do fim de seu mandato.

Cargos públicos e verbas federais tiveram peso especial na captação de apoio para enterrar a segunda denúncia contra o presidente.

Não é que Temer tenha saciado todo o apetite de sua base aliada, mas os 251 deputados que votaram a seu favor se alimentara­m da expectativ­a de ter esses recursos a seu dispor em uma campanha com financiame­nto escasso.

O Palácio do Planalto foi objetivo em seus esforços para controlar uma base aliada indócil e dispersa: ministros e líderes governista­s disseram aos parlamenta­res que apenas aqueles que votassem a favor do presidente seriam recompensa­dos com o poder da máquina federal —que rende dividendos eleitorais desde que a política é política.

Diante da oferta, muitos deputados que gostariam de se distanciar de um governo impopular, considerad­o tóxico para a disputa de 2018, refizeram as contas.

Era claro desde o início que não haveria 342 votos para autorizar a abertura de um processo contra Temer e afastá-lo do cargo.

O presidente continuari­a a despachar de seu gabinete e recarregar­ia a tinta de sua caneta. Seguindo a lógica política básica, seria mais inteligent­e estar a seu lado do que contra ele.

Cargos em órgãos federais, verbas públicas e inauguraçõ­es de obras são especialme­nte importante­s para eleições parlamenta­res.

Os deputados direcionam dinheiro para municípios de suas bases e, em troca, os prefeitos usam suas próprias máquinas locais para ajudá-los a renovar seus mandatos nas urnas.

É essa engrenagem que da- rá ao governo Temer alguma estrutura para se manter relativame­nte forte depois de uma crise política violenta, em que emergiu um presidente da Câmara que seduziu parlamenta­res, empresário­s e investidor­es como alternativ­a a um Palácio do Planalto debilitado.

Na gangorra política, a fragilizaç­ão de Temer significou a ascensão de Rodrigo Maia (DEM-RJ). Nas últimas sema- nas, ele passou a ser apontado como futuro protagonis­ta da pauta do país e, em especial, da agenda econômica.

De fato, o governo está convencido de que precisará conter os atritos com Maia e compartilh­ar poder com o presidente da Câmara para ter chances de fazer avançar medidas que precisam de aval do Congresso.

A sessão desta quarta-feira (25) mostrou que a coalizão governista está desorganiz­ada. O Planalto teve dificuldad­es até para atingir o quórum necessário para iniciar a votação.

Nesse cenário, Maia deve atrair para seu porto uma série de bancadas que parecem estar à deriva no plenário.

Vai oferecer pautas que têm apelo significat­ivo em setores de grande influência na política, como os ligados à segurança pública, ao agronegó- cio e ao mercado financeiro.

Apesar do peso do Legislativ­o e da estatura conquistad­a por Maia, o regime presidenci­alista ainda dá algum fôlego a Temer.

Os projetos aprovados na Câmara podem até turbinar o discurso de parlamenta­res em suas campanhas, mas quem pode oferecer o que importa na política real estará sentado do outro lado da Praça dos Três Poderes.

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