Votação mostra base governista desorganizada
Planalto sobreviveu porque soube usar a máquina para atrair parlamentares preocupados com a eleição de 2018
Michel Temer transformou a estrutura do governo em uma máquina eleitoral para sobreviver no cargo.
Com ela, construiu uma ponte para atravessar os 14 meses que o separam do fim de seu mandato.
Cargos públicos e verbas federais tiveram peso especial na captação de apoio para enterrar a segunda denúncia contra o presidente.
Não é que Temer tenha saciado todo o apetite de sua base aliada, mas os 251 deputados que votaram a seu favor se alimentaram da expectativa de ter esses recursos a seu dispor em uma campanha com financiamento escasso.
O Palácio do Planalto foi objetivo em seus esforços para controlar uma base aliada indócil e dispersa: ministros e líderes governistas disseram aos parlamentares que apenas aqueles que votassem a favor do presidente seriam recompensados com o poder da máquina federal —que rende dividendos eleitorais desde que a política é política.
Diante da oferta, muitos deputados que gostariam de se distanciar de um governo impopular, considerado tóxico para a disputa de 2018, refizeram as contas.
Era claro desde o início que não haveria 342 votos para autorizar a abertura de um processo contra Temer e afastá-lo do cargo.
O presidente continuaria a despachar de seu gabinete e recarregaria a tinta de sua caneta. Seguindo a lógica política básica, seria mais inteligente estar a seu lado do que contra ele.
Cargos em órgãos federais, verbas públicas e inaugurações de obras são especialmente importantes para eleições parlamentares.
Os deputados direcionam dinheiro para municípios de suas bases e, em troca, os prefeitos usam suas próprias máquinas locais para ajudá-los a renovar seus mandatos nas urnas.
É essa engrenagem que da- rá ao governo Temer alguma estrutura para se manter relativamente forte depois de uma crise política violenta, em que emergiu um presidente da Câmara que seduziu parlamentares, empresários e investidores como alternativa a um Palácio do Planalto debilitado.
Na gangorra política, a fragilização de Temer significou a ascensão de Rodrigo Maia (DEM-RJ). Nas últimas sema- nas, ele passou a ser apontado como futuro protagonista da pauta do país e, em especial, da agenda econômica.
De fato, o governo está convencido de que precisará conter os atritos com Maia e compartilhar poder com o presidente da Câmara para ter chances de fazer avançar medidas que precisam de aval do Congresso.
A sessão desta quarta-feira (25) mostrou que a coalizão governista está desorganizada. O Planalto teve dificuldades até para atingir o quórum necessário para iniciar a votação.
Nesse cenário, Maia deve atrair para seu porto uma série de bancadas que parecem estar à deriva no plenário.
Vai oferecer pautas que têm apelo significativo em setores de grande influência na política, como os ligados à segurança pública, ao agronegó- cio e ao mercado financeiro.
Apesar do peso do Legislativo e da estatura conquistada por Maia, o regime presidencialista ainda dá algum fôlego a Temer.
Os projetos aprovados na Câmara podem até turbinar o discurso de parlamentares em suas campanhas, mas quem pode oferecer o que importa na política real estará sentado do outro lado da Praça dos Três Poderes.