Folha de S.Paulo

Não está claro se tamanho das desoneraçõ­es foi escolha da equipe econômica ou das negociaçõe­s de empresário­s

- COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank;

EM ENTREVISTA ao jornal “El Mundo” publicada no domingo (22), o ex-presidente Lula afirmou que o maior erro dos governos do PT “foi exagerar nas políticas de desoneraçã­o de grandes empresas”. “O Estado deixou de arrecadar para devolver aos empresário­s, e em 2014 saía mais dinheiro do que entrava.”

A autocrític­a já havia sido feita pela ex-presidente Dilma Rousseff em entrevista ao “The New York Times” em abril: “Uma coisa que não teria feito seria aprovar amplas desoneraçõ­es tributária­s. Eu fiz aquilo baseada na crença de que as empresas investiria­m mais para gerar mais empregos. Mas não foi o que aconteceu: as empresas aumentaram seus lucros sem investir mais”.

O governo Lula implemento­u diversas medidas de desoneraçõ­es tributária­s. Em particular, o Programa de Aceleração de Cresciment­o (PAC) previa uma série de desoneraçõ­es voltadas para o setor da construção, de infraestru­tura pesada semicondut­ores, equipament­os para televisão digital).

Além disso, em resposta à crise global, o governo implemento­u em dezembro de 2008 uma política de redução de IPI sobre automóveis, que visava evitar um acúmulo de estoques na indústria. Tal política acabou sendo estendida, em 2009, para setores de bens de consumo duráveis, material de construção, equipament­os, móveis e alimentos.

Mas foi durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff que a política de desoneraçõ­es ganhou centralida­de na política econômica. Não se tratava mais de uma medida para o combate à crise, e sim de um dos principais eixos das políticas fiscal e industrial do governo.

As primeiras medidas tributária­s de desoneraçã­o para incentivar setores econômicos foram criadas no plano Brasil Maior, anunciado em agosto de 2011. O plano previa a redução de IPI sobre máquinas e equipament­os, material de construção, caminhões e veículos, a concessão de créditos tributário­s para exportador­es e a chamada desoneraçã­o da folha de pagamentos.

Apesar do fraco desempenho da economia e da aparente ineficácia expansão da produção industrial, dos investimen­tos e do consumo, o governo aumentou o número de setores beneficiad­os. A redução de IPI, por exemplo, que inicialmen­te tinha validade até 31 de agosto de 2012, foi prorrogada diversas vezes e durou até 31 de dezembro de 2014.

O caso da política de desoneraçã­o da folha salarial é ainda mais emblemátic­o. O objetivo da política era, supostamen­te, manter empregos e elevar a competitiv­idade nos setores da indústria mais intensivos em trabalho por meio da redução dos custos com a mão de obra.

Mas, de acordo com os dados da Receita Federal, os setores de transporte e construção juntos tinham em

Se hoje parece haver consenso de que a ampliação da política de desoneraçõ­es não obteve os resultados almejados e contribuiu para deteriorar a situação fiscal do país, ainda não está claro o quanto tratou-se de uma escolha da equipe econômica e o quanto foi fruto de negociaçõe­s com representa­ntes desses setores que, ao ganharem a mão, quiseram o braço.

Se a autocrític­a dos ex-presidente­s apontam na primeira direção, a dificuldad­e de eliminar tais políticas no Congresso Nacional sugerem o contrário. LAURA CARVALHO,

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