Lula e Geisel tomaram rumo semelhante na economia
PARA AUTOR, EX-GOVERNANTES, APESAR DE IDEOLOGIAS OPOSTAS, FIZERAM APOSTAS CONTRA A GLOBALIZAÇÃO E SAÍRAM DERROTADOS
DE SÃO PAULO
Autor de obras relevantes para a compreensão da história econômica do país, como “Mauá, Empresário do Império” (1995) e “Nem Céu Nem Inferno” (2015), o escritor e jornalista Jorge Caldeira, 61, lança “História da Riqueza no Brasil”, um de seus livros mais ambiciosos.
Mestre em sociologia e doutor em ciência política, Caldeira reavalia parte expressiva dos rumos econômicos trilhados pelo país.
Ele diverge da historiografia tradicional ao descrever, por exemplo, o Brasil Colônia. De acordo com os autores clássicos, nesse período só o latifúndio produzia riqueza, que era enviada ao exterior em sua quase totalidade. Caldeira escreve que a colônia tinha um mercado interno forte, muito além das grandes propriedades, e uma economia mais dinâmica que a da metrópole.
Para alcançar conclusões como essa, ele recorreu intensamente à antropologia e à econometria, que aplica a matemática e a estatística à teoria econômica.
“Quando você tem esses dados no computador e consegue comparar as informações, é possível chegar a um retrato espetacular. Os livros que faço são filhos dessa mudança tecnológica”, afirma Caldeira, que não critica a historiografia tradicional.
“Informações como as que eu obtive, a partir da econometria, simplesmente não estavam ao alcance dos clássicos”, afirma.
Nos capítulos finais de “História da Riqueza no Brasil”, o autor indica a proximidade do ponto de vista econômico do governo de Ernesto Geisel, na década de 70, e do segundo mandato de Lula, na segunda metade dos anos 2000.
Para Caldeira, no intuito de reforçar o mercado interno, ambos reduziram o contato da economia do Brasil com o exterior, levando o país à recessão.
“É difícil entender como, a partir de ideologias opostas, Lula e Geisel tenham tomado rumos semelhantes na economia. Essa é uma pergunta sobre a ideologia para a qual não tenho respostas. O livro traz perguntas, não respostas”, afirma. Brasil Colônia Os autores clássicos dizem que, nesse período, a riqueza foi para fora do país, e só o latifúndio produzia riqueza. Pela definição atual [baseada em estudos de econometria], a economia da colônia se tornou mais dinâmica que a da metrópole, mesmo com o governo central mandando dinheiro para fora do país. Esse é o retrato do Brasil em 1800.
Faço comparações possíveis com o resto do mundo. A essa altura, o Brasil tinha aproximadamente a mesma dimensão da economia dos Estados Unidos. Primeira República A visão tradicional é de um período agrário, em que o Brasil não progrediu muito. Prevalecia a política dos coronéis. De fato, a política era ruim, mas a economia não, como mostra a econometria.
Com as mudanças implantadas por Ruy Barbosa, em 1890, começa uma onda de crescimento gigantesca. Em 1906, a política de valorização do café contribuiu para o grande desenvolvimento econômico. O país crescia perto de 6% ao ano, às vezes mais.
Houve ainda uma modernização acelerada do Brasil. Em 1929, a indústria já era do tamanho da agricultura no PIB brasileiro. A partir de 1930 No período que vai de 1930 ao regime militar, há coincidência entre a interpretação tradicional e a econometria. A economia continua crescendo em ritmo acelerado, enquanto o mundo, não.
Considerando o intervalo entre 1890 e 1970, a economia brasileira foi a que mais cresceu no mundo, um desempenho excepcional.
O que mais interessa, no entanto, é o que aconteceu dos anos 70 em diante. Em 1973, o PIB do Brasil era maior que o da China. Foi neste momento que esses dois países tomaram decisões opostas.
Mao Tsé-Tung decidiu lançar a China ao comércio internacional, o que ocorreu também com Japão e Cingapura.
No Brasil, Ernesto Geisel interpretou o momento de modo diferente.
Decidiu aumentar o isolamento do país porque o mercado interno parecia para o governo dele muito melhor do que as oportunidades no mundo. Pegou, então, dinheiro emprestado no exterior Altos e baixos Se pensarmos no longo período de que esse livro trata, 520 anos, o Brasil tem cerca de 400 bons anos. Portanto, não é o fim do mundo.
O que há em comum nessas fases ruins, que somam 120 anos, é tratar uma peculiaridade local como se fosse boa para o universo. O Brasil não é o centro do mundo.
Quando a economia brasileira deixa de olhar para o resto do mundo, oportunidades são perdidas.
“
Em 1973, o PIB do Brasil era maior que o da China. Neste momento os dois países tomaram decisões opostas. Mao Tsé-Tung lançou a China ao comércio internacional, o que ocorreu também com Japão e Cingapura. No Brasil, Ernesto Geisel interpretou o momento de modo diferente “corrupção e outros problemas, esse erro estratégico do governo Lula, apoiado pelo Congresso Nacional e por empresários, resultou nessa recessão recente. Foi, portanto, uma segunda aposta perdida contra a globalização
AUTOR Jorge Caldeira EDITORA Estação Brasil (622 págs.) QUANTO R$ 69,90