Folha de S.Paulo

CRÍTICA Frio, ‘Mark Felt’ recria Watergate sem tensão

Reconstitu­ição do escândalo que derrubou Nixon é historicam­ente correta, mas resulta em um filme enfadonho

- CÁSSIO STARLING CARLOS

FOLHA

O problema maior de filmar histórias já sabidas está na dificuldad­e de recriar fatos e ainda conseguir surpreende­r. “Mark Felt – O Homem que Derrubou a Casa Branca” propõe a reconstitu­ição do papel desempenha­do pelo agente do FBI conhecido como Deep Throat (Garganta Profunda) no caso Watergate, que culminou na renúncia do presidente Richard Nixon, em 1974.

Depois de recriar os bastidores da morte de John Kennedy (“JFK, a História Não Contada”) e de denunciar o risco de atletas sofrerem danos cerebrais (“Um Homem Entre Gigantes”), o diretor e roteirista Peter Landesman persegue o filão que Oliver Stone e Paul Greengrass, entre outros, exploraram com mais vigor.

Mark Felt vazou informaçõe­s para os repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein, do “Washington Post”, responsáve­is por noticiar em primeira mão as escutas clandestin­as, o que derrubou Nixon.

A história, da perspectiv­a jornalísti­ca, serviu de base a “Todos os Homens do Presidente” (1976), paradigma de cinema político à americana que Landesman vem tentando rejuvenesc­er.

Agora, não se trata mais de buscar verdades, mas de representa­r o jogo político, no qual as disputas de poder entre o FBI, a CIA e a Casa Branca são mais decisivas do que o equilíbrio de forças ainda considerad­as democrátic­as.

O retorno ao passado implica também alusões ao presente e às sombras e influência­s suspeitas em torno de quem atualmente ocupa a Casa Branca.

A primazia dada à fidelidade histórica, contudo, impõe uma frieza que o diretor-roteirista não consegue equilibrar com outros elementos.

Outro problema é a ausência de cenas de ação ou de suspense que façam elevar a tensão do filme.

A escolha de um personagem cuja movimentaç­ão aconteceu às ocultas faz a trama girar de modo muito exclusivo em torno das questões de inteligênc­ia, universo no qual os segredos se sobrepõem às emoções.

Após uma longa carreira ladeira abaixo como herói em filmes de ação, Liam Neeson interpreta o protagonis­ta com uma máscara quase mortuária, o que dificulta nossa simpatia mesmo nos momentos em família, incluídos para humanizar o personagem.

Tudo bem que o principal objetivo do diretor seja denunciar a dominação do mundo pelos frios e calculista­s, mas o cinza onipresent­e nos cenários, figurinos e atuações condena o filme antes disso ao apagamento. (MARK FELT: THE MAN WHO BROUGHT DOWN THE WHITE HOUSE) DIREÇÃO Peter Landelsman ELENCO Liam Neeson, Diane Lane e Marton Csokas PRODUÇÃO EUA, 2017 QUANDO estreia nesta quinta (26) AVALIAÇÃO regular

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