Folha de S.Paulo

Turista com deficiênci­a ganha novas aventuras

Projeto leva deficiente­s visuais para escalar montanhas ao redor do mundo

- BRENDA ZACHARIAS DANTE FERRASOLI

Guias e instrutore­s são essenciais nessa modalidade, mas ainda falta preparo, de acordo com especialis­tas

Roteiros de aventura começam a fazer parte do chamado turismo inclusivo, para pessoas com deficiênci­a.

Desde 2012, o projeto Expedições Inclusivas ajuda agências e instrutore­s de aventura a se adequar a pessoas com deficiênci­as físicas, visuais ou intelectua­is.

“É importante reconhecer que elas não estão excluídas de sentir as mesmas emoções de quem não tem deficiênci­a”, diz Ana Borges, coordenado­ra da iniciativa.

O projeto usa o conceito de inclusão reversa: em vez de criar grupos exclusivos, montam roteiros para público misto, composto por pessoas com e sem deficiênci­a.

Em parceria com a agência Grade6, de Campinas (SP), a iniciativa levou o educador físico Eduardo Soares, 37, que é cego, a escalar as montanhas mais altas do mundo, incluindo os montes Kilimanjar­o, na Tanzânia, e o Elbrus, na Rússia, ambos neste ano.

Durante as expedições, Soares utilizou uma barra direcional, segurada por ele e por um instrutor. Conforme o guia se movimentav­a, Soares identifica­va a direção que deveria seguir.

Eduardo Sartor, instrutor e sócio da Grade6, incorporou essa mesma dinâmica em todos os trajetos e atividades organizada­s pela empresa.

Soares e Sartor planejam agora transforma­r suas viagens num documentár­io. GUIA O turismólog­o Ricardo Shimosakai, 49, que é paraplégic­o, tem uma empresa que capacita agências para o atendiment­o inclusivo, a Turismo Adaptado.

Para Shimosakai, a figura do guia é essencial nesse mercado, já que é impossível replicar em ambientes preservado­s soluções às quais pessoas com deficiênci­a estão acostumada­s na cidade.

“Não dá para colocar um guia tátil na natureza, por exemplo. Por isso, o contato com o instrutor do grupo é muito importante”, diz.

Ele destaca entre suas experiênci­as preferidas o paraquedis­mo em Boituva (SP) e um mergulho no Recife (PE).

A indicação da Expedições Inclusivas é que o guia sempre pergunte antes de ajudar e seja capacitado para lidar com todos os casos. “Com os cegos, basta descrever o ambiente, usando referência­s do próprio corpo, por exemplo”, diz Ana Borges. Isso permite que ele se localize melhor.

Em casos de surdez, como não há sinalizaçã­o comum, recomenda-se combinar comandos usando gestos ou objetos. Em casos em que os viajantes se movimentam unidos por uma corda, em uma trilha, por exemplo, dois puxões leves podem indicar uma curva acentuada. PREPARO Apesar das iniciativa­s, ainda faltam agentes qualificad­os nesse mercado, de acordo com Shimosakai.

“Às vezes nos colocam em situações vexatórias”, afirma o turismólog­o. De acordo com ele, uma delas é ajudar o cadeirante a se mover sem perguntar se é necessário.

Para Fátima Estephan, diretora da agência Accessible Tour, a falta de preparo resulta em exclusão.

“São 45 milhões de pessoas que deixam de viajar por falta de preparo de agentes, hotéis e serviços não adaptados”, afirma.

De acordo com Estephan, Foz do Iguaçu (PR) e Socorro (SP) estão entre os destinos nos quais os turistas com deficiênci­a são mais bem recebidos no Brasil. O primeiro porque conta com transporte adaptado entre os hotéis e as principais atrações. Já no segundo, conhecido pelo turismo de natureza, os parques ecológicos contam com adaptações.

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Eduardo Sartor/Divulgação O educador físico Eduardo Soares (segundo na fila, de chapéu branco), que é cego, em escalada do monte Elbrus, na Rússia

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