Folha de S.Paulo

Epidemia de mortes por opiáceos vira emergência de saúde nos EUA

Em 2016, 53.300 americanos morreram de overdose de heroína, fentanil e analgésico­s opiáceos

- SILAS MARTÍ PATRÍCIA CAMPOS MELLO

Críticos consideram medida de Trump insuficien­te, porque não acarreta liberação imediata de recursos

O presidente Donald Trump declarou nesta quinta-feira (27) que a epidemia de opiáceos nos Estados Unidos é uma emergência de saúde pública nacional, após muitas críticas sobre sua aparente indiferenç­a à crise que matou 53.300 americanos no ano passado.

Mas o fato de não ter classifica­do a epidemia como uma “emergência nacional”, o que levaria à liberação imediata de recursos para iniciativa­s de combate a opiáceos, desagradou uma ala do governo e do Congresso, que quer medidas mais concretas.

“Estávamos esperando o presidente dizer que pediria US$ 100 bilhões ao Congresso para isso, coisas específica­s”, disse o senador democrata Edward Markey. “Mas só palavras sem ações não passam de promessas falsas.”

Sua declaração não garante mais recursos, mas permite que fundos sejam redirecion­ados, verbas cheguem mais rapidament­e às comunidade­s atingidas e barreiras regulatóri­as sejam removidas.

Em discurso aberto pela primeira-dama, Melania, Trump usou a luta contra o alcoolismo de seu irmão mais velho, Fred, como um exemplo da dificuldad­e em lidar com o vício em drogas.

Num esforço calculado para abrandar seu estilo, Trump falou em “famílias dilacerada­s” pelas drogas, “órfãos dos opioides” e de uma “geração desperdiça­da” ao prometer liberar recursos para tratar viciados em heroína e analgésico­s à base de opiáceos —os Estados Unidos são o país que mais consome esses medicament­os no mundo.

No ano passado, quase um milhão de americanos usaram heroína e 11 milhões abusaram de analgésico­s opiáceos. No mesmo ano, 64 mil americanos morreram de overdose de drogas, sendo 53.300 de analgésico­s opiáceos ou de drogas como heroína e fentanil.

“Estamos lidando com a maior crise de drogas da história dos Estados Unidos”, disse o presidente, rodeado de pessoas que perderam amigos ou parentes para os opiáceos. “Overdoses agora são a principal causa de morte no país. Mais pessoas morrem de overdose do que em acidentes de carro ou mortas por armas de fogo.”

Trump disse que reverteria uma lei que proíbe que verbas do sistema público de saúde sejam usadas nesse tipo de tratamento e que exigirá novos treinament­os voltados a médicos. 1999 MURO Também disse que financiari­a campanhas publicitár­ias antidrogas, pesquisas de tratamento­s alternativ­os, analgésico­s que não induzam ao vício e maior vigilância, tanto de pacotes enviados aos EUA quanto nas fronteiras, usando a crise atual dos opiáceos para defender a expansão do muro na divisa com o México, uma de suas maiores promessas de campanha.

“Por muito tempo, perigosos cartéis criminosos puderam se infiltrar em nosso país”, disse Trump. “Vamos construir um muro que vai ajudar [a acabar] com o problema. E precisamos trabalhar com outros países para barrar as drogas na origem.” 2015 AS DROGAS QUE MAIS MATARAM EM 2016* Número de pessoas mortas Opiáceos Fentanyl e semelhante­s Heroína Opioides legais Cocaína Metanfetam­ina Metadona

Nesse ponto, ele mencionou a América Latina e a China, país conhecido por produzir fentanil, um opioide ainda mais potente que a heroína. Trump adiantou que falaria do assunto com o presidente chinês, Xi Jinping, em sua visita ao país em breve.

Trump fez campanha prometendo combater o vício em medicament­os opiáceos e, depois de assumir, criou uma comissão para estudar o problema. O colegiado recomendou que o presidente declarasse uma emergência nacional, o que levaria à liberação imediata de recursos e ampliaria o acesso para a droga antioverdo­se naloxona, que é cara e está em falta em vários Estados.

O ex-secretário de saúde, Tom Price, disse em agosto não achar necessário declarar emergência. Quando era deputado, Price se opôs a uma lei que obrigava os planos de saúde a cobrir tratamento para dependênci­a. Ele não acreditava na eficácia dos tratamento­s com metadona para viciados em heroína. Caiu dois meses depois.

O primeiro indicado de Trump ao posto de “czar antidrogas”, o deputado Tom Marino, abandonou o cargo na semana passada depois que vieram à tona revelações de ele teria atuado a favor da indústria farmacêuti­ca contra medidas para restringir vendas de medicament­os que acabavam no mercado negro.

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