Folha de S.Paulo

Com boicote, Quênia reelege presidente

Observador­es estimam que menos de 40% dos eleitores tenham comparecid­o após anulação de pleito em agosto

- JOHN AGLIONBY

Líder opositor acusa presidente Kenyatta, que concorreu com cinco desconheci­dos, de ‘ditadura eleitoral’

Milhões de quenianos boicotaram a repetição da eleição presidenci­al nesta quinta (26), enquanto protestos expuseram profundas divisões políticas no país.

A comissão eleitoral não divulgou dados, mas observador­es estimam que a participaç­ão não tenha chegado a 40% (nas eleições gerais em agosto, votaram 79,5%).

O pleito deve reconduzir ao poder o presidente Uhuru Kenyatta. Mas a alta abstenção e a recusa de Raila Odinga, líder de oposição, a disputar uma eleição que ele chama de engodo afetam a credibilid­ade do sistema queniano.

“Quando você junta todas as peças, está claro que os quenianos têm sérias reservas sobre a capacidade da comissão eleitoral de produzir eleições livres, justas e críveis”, disse Dismas Mokua, analista independen­te.

Ao menos três pessoas foram mortas em protestos, e a comissão eleitoral foi obrigada a adiar a votação em quatro condados no oeste do país, cuja seções não abriram por causa de manifestaç­ões.

A Suprema Corte convocou novas eleições após anular o resultado do pleito de agosto alegando irregulari­dades e ilegalidad­es em resposta à apelação feita por Odinga.

Muitos quenianos se dizem cansados do histórico de eleições fraudadas e contestada­s. A maior economia do Leste da África mergulhou em sua pior crise política desde as eleições de 2007, quando uma explosão de violência deixou mais de 1.200 mortos.

Odinga se recusou a participar da nova votação porque suas exigências de reforma da comissão eleitoral não foram cumpridas. Uma última tentativa de ativistas de atrasar a votação nesta semana falhou quando só 2 dos 7 juízes comparecer­am na Suprema Corte, fazendo a oposição acusar o governo de tentar subverter a Constituiç­ão.

Enquanto as tensões políticas crescem no Quênia, o país enfrenta um período prolongado de incerteza, o risco de mais violência e mais batalhas jurídicas. Cerca de 50 pessoas foram mortas desde que Kenyatta foi declarado vencedor em agosto.

Em partes de Nairóbi, a capital, postos de votação abriram com horas de atraso após confronto entre a polícia e manifestan­tes. “Estamos lutando por nossos direitos, não queremos que esta eleição continue porque não é justa e livre”, disse um manifestan­te na favela de Kibera, que deu como nome Nelson Mandela. Ele e uma dúzia de outros construíra­m uma barricada para bloquear o acesso ao posto eleitoral.

Regina Opondo, que preside o Grupo de Observação das Eleições, consórcio de organizaçõ­es civis quenianas, disse que o baixo comparecim­ento se deveu provavelme­nte “ao boicote [pela oposição] e porque alguns apoiadores [de Kenyatta] podem ter achado que o resultado estava dado e não precisavam votar”.

Kenyatta enfrentou cinco candidatos pouco conhecidos que juntos somaram menos de 1% dos votos em agosto. O presidente, porém, rejeita a ideia de que há erosão da democracia no Quênia.

“O Quênia está provando que nossa democracia está amadurecen­do. Estamos cansados de eleitorali­smo. Está na hora de seguir adiante.”

Odinga disse na quarta (25) que transforma­ria sua coalizão Superalian­ça Nacional em um movimento de resistênci­a para fazer campanha contra a “ditadura eleitoral” de Kenyatta e pressionar por eleições livres em 90 dias.

 ?? Ben Curtis/Associated Press ?? Manifestan­tes protestam em Nairóbi contra eleição que reconduziu Uhuru Kenyatta ao governo; presidente nega corrosão da democracia no país
Ben Curtis/Associated Press Manifestan­tes protestam em Nairóbi contra eleição que reconduziu Uhuru Kenyatta ao governo; presidente nega corrosão da democracia no país

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