Jornal anti-Putin quer dar armas a seus profissionais
Medida foi anunciada após ataque a jornalista de rádio opositora do Kremlin
‘Novaia Gazeta’, de Moscou, diz que vai fornecer pistolas com balas de borracha como instrumento de defesa
Um dos principais jornais de oposição ao governo de Vladimir Putin, o “Novaia Gazeta”, anunciou nesta sextafeira (27) que irá distribuir armas que disparam balas de borracha para que seus profissionais possam se defender de ataques.
A medida foi divulgada três dias depois de a apresentadora de rádio Tatiana Felgenhauer ser esfaqueada no estúdio da rádio Ekho Moskvi (eco de Moscou, em russo) —a única estação independente do Kremlin no país.
O homem que a atacou foi preso, e o governo trata o caso como um evento motivado por “loucura”. Tatiana, 32, segue internada.
“Eu vou armar a Redação. Vamos fornecer outros dispositivos de segurança aos jornalistas, que não irei revelar. Não temos opção”, afirmou à imprensa russa o editor-chefe do “Novaia Gazeta” (novo jornal), Dmitri Muratov.
Ele disse que está em negociações com o Ministério do Interior do país, que regula o porte de armas —modelos com balas não letais podem ser comprados com facilidade.
O adjunto de Muratov, Sergei Sokolov, afirmou por sua vez que, “se o Estado não está pronto para nos proteger, nós vamos nos proteger sozinhos”. A publicação emprega cerca de 20 jornalistas.
Recentemente, a fabricante de armas Kalashnikov, que produz o famoso fuzil AK-47, divulgou que daria desconto de 10% para jornalistas interessados em adquirir pistolas de pressão que disparam balas de borracha.
O episódio é mais um na longa disputa entre meios de comunicação independentes e o Kremlin, que controla as principais redes de TV do país e tem grande influência sobre a maioria dos jornais, revistas e sites russos.
Quatro jornalistas do “Novaia Gazeta” foram mortos desde o ano 2000, quando Putin assumiu o governo pela primeira vez.
O caso de maior repercussão foi o de Anna Politkovskaia, assassinada a tiros em 2006. Ela era uma repórter investigativa e crítica aberta do presidente.
O jornal foi fundado em 1993 com a ajuda do último presidente soviético, Mikhail Gorbatchov, que usou o dinheiro que ganhou ao receber o Prêmio Nobel da Paz de 1990 para equipar a Redação.
Os antigos computadores estão lá ainda, no hall de entrada do jornal. A publicação circula três vezes por semana, com tiragem de cerca de 180 mil exemplares.
Desde a elevação de Putin ao poder, a “Novaia Gazeta” assumiu um tom explicitamente oposicionista.
A política oficial do Kremlin é dar de ombros e classificar o jornalismo praticado por órgãos como o jornal ou a Ekho Moskvi como propaganda, o que por vezes é justificado pelo tom militante das reportagens.
A “Novaia Gazeta” recebeu prêmios internacionais de liberdade de imprensa e recentemente foi vítima de ameaças após publicar reportagens sobre a perseguição a homossexuais na Tchetchênia, república russa.