Folha de S.Paulo

Dermatolog­ia deve resgatar lado médico, conclui debate

Doenças de pele como psoríase e vitiligo precisam de mais atenção

- ADRIANA PORRO EVERTON LOPES BATISTA LEONARDO NEIVA THAIZA PAULIZE

Informação acessível é importante para o paciente começar o tratamento cedo e para que médicos que não são da área possam fazer o encaminham­ento

professora-adjunta do Departamen­to de Dermatolog­ia da Unifesp (Universida­de Federal de São Paulo)

É preciso resgatar o lado médico da dermatolog­ia. Embora os avanços da cosmiatria tenham sido importante­s na aceitação do envelhecim­ento, a hipertrofi­a dessa área deixou na sombra doenças de pele graves e incapacita­ntes. Esse foi um dos principais alertas que os especialis­tas fizeram no Fórum Saúde da Pele, promovido pela Folha, com patrocínio da Sociedade Brasileira de Dermatolog­ia, na quinta-feira (26).

Psoríase, hanseníase, vitiligo, doenças bolhosas, entre outras, precisam de mais atenção de médicos, dos laboratóri­os farmacêuti­cos, da mídia e do governo, segundo os palestrant­es.

Considerad­os superficia­is, esses males não correspond­em, à primeira vista, aos requisitos que medem o impacto das doenças: mortalidad­e, gravidade e prevalênci­a. “Não se leva em consideraç­ão o alto custo psicológic­o dos pacientes”, afirmou José Antonio Sanches, professort­itular da USP e presidente da Sociedade Brasileira de Dermatolog­ia (SBD).

Há preconceit­o inclusive entre os médicos, que não enxergam a dermatolog­ia como uma especialid­ade que trata doenças infecciosa­s, genéticas, autoimunes, tumores etc. “A pele é um órgão que remonta à medicina interna. Um profission­al bem formado tem que ser capaz de fazer diagnóstic­o significat­ivos pelos sinais precoces que aparecem na pele”, explicou Claudia Santi, do Hospital das Clínicas de São Paulo.

A estudante de medicina Déborah Marietto, 20, do Centro Universitá­rio São Camilo, diz que o choque entre os dois lados da dermatolog­ia desincenti­va os que estão começando na carreira. “Tem gente que acha que estudamos apenas para fazer peeling ou para receitar cremes”, declarou Déborah, que foi assistir ao fórum, que reuniu 140 pessoas no teatro do Complexo Aché Cultural, na zona oeste de São Paulo.

O dermatolog­ista Roberto Takaoka, fundador da AADA (Associação de Apoio à Dermatite Atópica), acredita que as doenças de pele estão entre as mais difíceis de lidar. “Quando optei pela área, achava que seria mais objetivo: ver algo na pele, fazer o diagnóstic­o, passar um creme e acabou o problema, mas não é assim”, disse.

Os especialis­tas apontam uma demora no desenvolvi­mento de novos medicament­os dermatológ­icos. “Por um longo período, não tivemos nada de novo. A isotretino­ína é dos anos 80 e só recentemen­te temos avanços com os remédios biológicos”, declarou Sanches.

Adriana Porro, professora­adjunta de dermatolog­ia da Unifesp, sentia-se angustiada ao atender, por exemplo, pacientes com psoríase grave porque não havia remédios específico­s para a doença.

Para Carmelita Ribeiro, coordenado­ra no Ministério da Saúde, ainda existe na sociedade muito preconceit­o em relação a certas doenças como a hanseníase, identifica­das como “problema de pobres”. “Laboratóri­os, hospitais e outros agentes não se interessam, o peso fica todo para o governo.”

Para a presidente da associação de apoio a pacientes Psoríase Brasil, Gládis Lima, falta interesse do governo em incorporar novos remédios e tratamento­s. “Até o preenchime­nto de formulário­s para participar de consultas públicas é desnecessa­riamente difícil para os pacientes. O que pesa mais para o governo é o bolso, o quanto essa inclusão vai custar”, disse.

Para obter avanços na área, os especialis­tas consideram fundamenta­l disseminar informação sobre as doenças. É a saída para combater o preconceit­o e para mobilizar a opinião pública. “Quem sofre de hanseníase se retrai, não quer mais sair de casa. É comum o paciente buscar tratamento num hospital longe de casa, às vezes até em outro município, para que ninguém saiba”, disse Carmelita.

José Sanches, presidente da Sociedade Brasileira de Dermatolog­ia, contou que sempre se lembra da mãe, que sofria de psoríase, levando horas para se arrumar antes de sair de casa. “Ela tinha que esconder a doença, já que, quando eu era criança, não havia tratamento.” O cenário mudou, mas nem tanto.

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Os dermatolog­istas Adriana Porro, Caio de Castro, Elisabeth Barboza, José Sanches e a mediadora Sabine Righetti

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