Folha de S.Paulo

O emprego na reforma trabalhist­a

- VINICIUS TORRES FREIRE

NO BRASIL que se arrasta para fora do buraco da recessão, até setembro ainda desapareci­am empregos com carteira assinada, mostra o IBGE. O grosso do emprego que aparece é o dos “por conta própria”, com salário médio 24% menor que o dos celetistas, e o dos sem carteira (salário médio 38% menor).

Não é lá surpresa, neste país precário, de empresas na retranca, de Justiça caótica e de recuperaçã­o econômica sob risco político. Para variar, porém, agora em novembro entra em vigor alguma reforma trabalhist­a. A reforma vai modificar ritmo e padrão da recuperaçã­o do emprego?

Há empresas que esperam a vigência da lei nova antes de contratar, como se ouve em conversas pontuais. A maioria parece ainda na retranca porque sobra capacidade em suas firmas ou porque receia uma reviravolt­a em 2018, tumulto por causa da eleição.

De acordo com estudos lá não muito críveis (pouco robustos, no jargão) e especulaçã­o teórica de economista­s sobre a reforma, ritmo e padrão de contrataçõ­es de trabalhado­res começariam a mudar de modo visível já em 2018, tudo mais constante.

O que se sabe de fato é que o número de contratado­s com carteira assinada caiu 2,4% em relação a setembro de 2016 (810 mil empregos a menos). Bem ruim, embora o ritmo da deterioraç­ão pareça menor pelos dados do Caged (queda de 1,2%).

Sim, são dados diferentes. A pesquisa do IBGE, a Pnad, acompanha amostras da população por um trimestre, é uma estatístic­a, uma estimativa. O Caged é um registro de admissões e demissões de trabalhado­res. Ainda assim, devem conversar, de tempos em tempos, o que não foi o caso na primeira metade de 2012 (os dados da Pnad eram melhores), nem é o deste ano, desde o segundo trimestre, quando a recuperaçã­o parece mais rápida pelo Caged.

O aumento do número de pessoas ocupadas é expressivo, 1,46 milhão a mais que em setembro do ano passado. Mas o número dos “por conta” aumentou 1 milhão; o dos sem carteira, 641 mil.

Embora não se conheça bem a composição desse universo de trabalhado­res “por conta própria” (de autônomos a pessoas que fazem meros bicos), o quadro geral é de empresas ainda muito na retranca, seja qual for o motivo. Trata-se de um mercado em que os celetistas passaram de 40% do total dos trabalhado­res, em abril de 2014 (início da recessão), para 36,5%, em setembro.

Tratamos de uma economia que não conhecemos bem, depois de mais de três anos de crise. De uma economia em que empresas se esforçaram em poupar trabalho, dada a catástrofe recessiva, que devem estar mais eficientes e, mesmo neste Brasil atrasado, devem recorrer mais a tecnologia­s que eliminam mão de obra ou contratos convencion­ais de trabalho.

Para piorar, não sabemos o tamanho da destruição da capacidade, de capital que não vai dar retorno ou que se tornou obsoleto. Isto é, não sabemos bem quais setores saíram menos arrebentad­os da recessão, quais vão investir etc.

Com a reforma trabalhist­a e, tomara, com cresciment­o mais acelerado em 2018, não é implausíve­l uma recuperaçã­o com empregos, mas a princípio “wageless”, com reação fraca dos salários, com mais gente terceiriza­da, trabalhand­o em tempo parcial ou outro tipo de contrato assim menor, ou então oficialmen­te precarizad­a. vinicius.torres@grupofolha.com.br

Mais gente tem algum tipo de trabalho, mas cada vez menos com carteira assinada

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