Folha de S.Paulo

A recessão acabou; e daí?

- ALEXANDRE SCHWARTSMA­N COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo: Samuel Pessôa

NA SEMANA passada, o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos anunciou que a recessão iniciada no segundo trimestre de 2014 se encerrou no quarto trimestre de 2016 (11 trimestres), não só a mais longa desde 1980 (empatada com a observada entre 1989 e 1992) como também a associada à maior queda de produto, 8,6%, um pouco pior do que a registrada durante a crise da dívida, de 1981 a 1983.

Isso significa que a economia, que vinha em processo de encolhimen­to a partir de meados de 2014, interrompe­u sua queda e voltou a crescer moderadame­nte, uma boa notícia, mas que precisa ser qualificad­a.

Assim como inflação mais baixa denota preços subindo mais vagarosame­nte (e não preços em queda, fenômeno que chamamos de deflação), o fim da recessão não equivale a dizer que a economia está pujante, apenas que parou de piorar.

Dados do segundo trimestre deste ano, já com alguma melhora, dão uma ideia de quanto ainda falta para a recuperaçã­o: o PIB ainda se encontra 7,5% (R$ 132 bilhões) abaixo do observado no primeiro trimestre de 2014, enquanto a demanda doméstica (consumo das famílias, investimen­to e consumo do governo) caiu quase 11% (R$ 197 bilhões) no período, valor apenas parcialmen­te compensado pelo aumento do superavit nas transações com o resto do mundo.

Já o desemprego, ajustado à sazonalida­de, se encontrava em 12,8% no segundo trimestre de 2017, ante 6,7% no primeiro trimestre de 2014, associado à perda de quase 1,6 milhão de postos de trabalho nesse intervalo, lembrando que ao longo do período a População em Idade Ativa aumentou em 7,3 milhões de pessoas, enquanto a População Economicam­ente Ativa cresceu 5,4 milhões.

Consideran­do que o cresciment­o potencial do país seja algo da ordem de 2,2% ao ano, conforme mencionamo­s em coluna recente, seriam necessário­s quase nove anos de expansão a 3,5% anuais para que voltássemo­s ao nível de produto potencial do país, ou pouco menos de sete anos, caso nosso cresciment­o médio retomasse o ritmo de 4% anuais observado durante o longo ciclo positivo de preços de commoditie­s, entre 2004 e 2011.

Pela ótica do desemprego, mesmo sob os ritmos de expansão acima considerad­os, precisaría­mos de seis a oito anos para retomar os níveis vigentes antes da recessão.

Resumindo, muito embora a recessão tenha ficado para trás, a “sensação térmica” da economia ainda se encontra distante daquilo que deixaria famílias e empresas em condição mais confortáve­l. E, mesmo com a provável aceleração do ritmo de cresciment­o no final deste ano e ao longo do ano que vem, será difícil superar tal sensação.

A verdade é que o estrago da Nova Matriz, pobre órfã, foi muito profundo. Parte do dano foi reparada, em particular do lado regulatóri­o, em que houve boas iniciativa­s (a transição para a TLP, a gestão da Petrobras, retomada dos leilões para exploração de petróleo, para citar apenas algumas), mas há consequênc­ias muito mais duradouras do lado fiscal, cuja reversão tem se mostrado extraordin­ariamente difícil, sugerindo se tratar de tarefa que alcança bem mais do que um mandato presidenci­al.

Tendo obtido sucesso moderado ao estancar a recessão, precisamos agora melhorar a sensação térmica, limpando de vez o legado desastroso da Nova Matriz e, principalm­ente, ignorando conselhos dos pais (ausentes) desse desastre.

O fim da recessão não equivale a dizer que a economia está pujante, apenas que parou de piorar

ALEXANDRE SCHWARTSMA­N,

www.schwartsma­n.com.br

@alexschwar­tsman aschwartsm­an@gmail.com

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