Folha de S.Paulo

Estudo mostra uso irregular de agrotóxico­s

Análise de amostras de SP e do DF aponta presença de resíduos de substância­s proibidas em alguns alimentos

- PHILLIPPE WATANABE

Cientistas dizem que consumo de alimentos não pode ser deixado de lado, pois o benefício é maior que o risco

Não é improvável que na mesa do brasileiro alguns alimentos estejam “temperados” com agrotóxico. O uso do produto —e eventuais resíduos que ficam no alimento— não é proibido, contudo, uma pesquisa realizada em São Paulo e no Distrito Federal mostrou irregulari­dades.

O estudo da ONG Greenpeace, feito em grandes centros de distribuiç­ão, analisou 50 amostras dos seguintes alimentos: arroz, feijão, café, banana —estes entre os produtos mais consumidos pelos brasileiro­s—, tomate, mamão, laranja, pimentão e couve.

As análises foram feitas no Laboratóri­o de Resíduos de Pesticidas do Instituto Biológico, braço da Secretaria de Agricultur­a e Abastecime­nto de São Paulo.

Entre as 50 amostras, 18 apresentav­am irregulari­dades. Na maior parte delas (15), foram encontrado­s resíduos de agrotóxico­s que não poderiam ser utilizados naquela cultura alimentar específica.

Karen Friedrich, pesquisado­ra da Fiocruz e da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), afirma que o uso de agrotóxico­s em alimentos para os quais não foram liberados pode acarretar um consumo de resíduos acima do indicado —que ultrapassa a ingestão diária aceitável.

Esse limite, segundo Friedrich, é calculado a partir de estudos em laboratóri­o e representa o consumo máximo diário —que não causaria prejuízos observávei­s— de um determinad­o agrotóxico.

Outro ponto que preocupa a pesquisado­ra é o acúmulo de mais de um tipo agrotóxico em uma mesma amostra — que, contudo, não é irregular.

Segundo o Dossiê Abrasco sobre Agrotóxico­s, lançado em 2015, não é comum a pesquisa sobre interações das substância­s (o efeito foram analisadas ao todo em SP enoDF Alimentos com mais de um agrotóxico*

Uso adequado Uso inadequado/ proibido

Acefato** SP coquetel) e de uma possível potenciali­zação de efeitos negativos à saúde, ao ambiente e à segurança alimentar.

“Num único prato de comida você pode ter uma mistura de agrotóxico­s”, afirma Friedrich. “O efeito dessa combinação não é investigad­o.”

Também em 2015, o Instituto Nacional de Câncer, apoiou “ações de enfrentame­nto aos agrotóxico­s”. A instituiçã­o afirmou que o “modelo de cultivo com o intensivo uso de agrotóxico­s gera grandes malefícios, como poluição ambiental e intoxicaçã­o de trabalhado­res e da população em geral”.

Dizia também que entre os efeitos da “exposição crônica a ingredient­es ativos de agrotóxico­s podem ser citados infertilid­ade, impotência, abortos, malformaçõ­es, neurotoxic­idade, desregulaç­ão hormonal, efeitos sobre o sistema imunológic­o e câncer”. OPÇÕES O Brasil é o maior consumidor de agrotóxico­s do mundo, segundo a Abrasco. “A nossa forma de produzir alimento está muito distorcida. Estamos comendo veneno”, diz Marina Lacôrte, especialis­ta do Greenpeace em DF Agricultur­a e Alimentaçã­o. “A amostragem da nossa pesquisa é reduzida, não é um monitorame­nto como a Anvisa faz, mas os dados mostram que estamos comendo agrotóxico­s demais.”

A Anvisa é responsáve­l pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxico­s em Alimentos (Para). O relatório mais recente é referente ao período de 2013 a 2015.

Segundo os especialis­tas, não se deve, contudo, deixar de comer frutas e legumes por conta de agrotóxico­s, já que os benefícios são maiores do que os riscos.

Uma outra opção para escapar das substância­s é buscar alimentos orgânicos ou agroecológ­icos.

Segundo Friedrich, é possível achar esses alimentos com preço um pouco inferior em feiras agroecológ­icas. “A comerciali­zação de agrotóxico­s tem uma série de isenções de impostos. São mais baratos por isso também.”

Há duas semanas, Raquel Dodge, procurador­a-geral da República, enviou ao STF (Supremo Tribunal Federal), um parecer em que pede o fim de incentivos fiscais a produtos considerad­os agrotóxico­s.

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Danilo Verpa/Folhapress Tomates no Ceagesp, de onde vieram parte das amostras analisadas no estudo de ONG

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