Stents não aliviam dor cardíaca, diz estudo
Estima-se que mais de 500 mil pessoas recebam o dispositivo todos os anos para esse fim
Um procedimento usado para aliviar dores cardíacas em centenas de milhares de pacientes a cada ano na verdade é inútil para muitos deles, segundo um estudo publicado na quarta-feira (1º).
Seu foco é a inserção de stents, pequenas gaiolas de arame usadas para manter abertas artérias bloqueadas. O dispositivo pode salvar vidas quando usado para abrir as artérias de alguém que esteja sofrendo um ataque cardíaco.
Mas ele costuma ser usado com mais frequência em pacientes que têm uma artéria bloqueada e sofrem dores no peito, por exemplo, ao subir escadas. Mais de 500 mil pacientes de doenças cardíacas recebem stents a cada ano para aliviar dores no peito, no cômputo mundial, de acordo com os pesquisadores. E há estimativas ainda mais altas. O procedimento de inserção custa de US$ 11 mil a US$ 41 mil, nos hospitais dos EUA.
O novo estudo, publicado pela revista “Lancet”, atordoou os cardiologistas porque contraria décadas de experiência clínica. As constatações causam questões sobre se os stents deveriam ser usados com tanta frequência —se é que deveriam ser usados— para tratar dores no peito.
Para o estudo, Justin Davies, cardiologista do Imperial College de Londres, e seus colegas recrutaram 200 pacientes que sofriam bloqueio profundo em uma artéria e dores no peito severas o bastante para limitar a atividade física —duas razões comuns para o uso de um stent.
Os participantes foram tratados durante seis semanas com remédios que reduzem o risco de ataques cardíacos, além de uma estatina e de um remédio para pressão, bem como medicamentos que aliviam as dores no peito ao desacelerar o coração ou abrir vasos sanguíneos.
Em seguida, os pacientes passaram por um procedimento cirúrgico, real ou simulado, de inserção de stent. Esse é um dos poucos estudos de cardiologia no qual um procedimento simulado foi usado em pacientes do grupo de controle, para posterior comparação com pacientes que receberam o tratamento real.
Os stents fizeram o que era esperado deles, nos pacientes que os receberam. O fluxo de sangue pela artéria até então bloqueada melhorou consideravelmente. Quando os pesquisadores testaram os pacientes seis semanas mais tarde, os dois grupos declararam sentir menos dores no peito, e se saíram melhor nos testes ergométricos do que antes do procedimento.
Os pesquisadores constataram ainda que não existia diferença real entre os grupos. Os que passaram pelo procedimento simulado se saíram tão bem quando aqueles que receberam stents.
Cardiologistas dizem que um dos motivos pode ser que a aterosclerose afeta muitos vasos sanguíneos, e aplicar um stent ao maior dos bloqueios pode não fazer grande diferença quanto ao desconforto sentido pelo paciente. As pessoas que reportaram que se sentiam melhor podem estar apenas desfrutando do efeito placebo do procedimento. PAULO MIGLIACCI