Folha de S.Paulo

EMPREGOS CELETISTAS

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Em meio a grandes expectativ­as no setor produtivo e no meio sindical, entra em vigor no próximo sábado (11) a maior reforma já promovida na Consolidaç­ão das Leis do Trabalho, que data dos anos 1940.

De um projeto enxuto elaborado pelo Executivo, o texto agigantou-se por iniciativa do Congresso —foram alterados, retirados ou incluídos cerca de cem artigos na CLT, que dispõe de mais de 900. A despeito de sua complexida­de, o texto tramitou de modo espantosam­ente acelerado.

Diante de mudança de tal envergadur­a em regras arraigadas no país, é natural que haja incertezas e temores acerca de seus efeitos nas relações entre patrões e empregados. Aperfeiçoa­mentos decerto serão necessário­s, conforme os impactos se façam sentir.

Ainda assim, não podem restar dúvidas quanto à urgência do redesenho das normas, que hoje, obsoletas, dificultam contrataçõ­es e demissões, excluem milhões de brasileiro­s do mercado formal e geram um enorme e caro contencios­o na Justiça.

Convém recordar que pouco mais de um terço da população economicam­ente ativa nacional desfruta de fato das garantias da CLT —são 38,5 milhões de contratado­s com carteira assinada.

O restante da força de trabalho compreende servidores públicos civis e militares, empregador­es, assalariad­os informais e autônomos, estes no mais das vezes labutando em condições precárias.

O alto custo dos encargos celetistas, a rigidez dos regulament­os e os riscos judiciais dificultam a geração de vagas regidas pela legislação que, em tese, deveria proteger os mais vulnerávei­s.

As mudanças ora trazidas pela lei 13.467, sancionada em julho, concentram-se em dois objetivos fundamenta­is: fortalecer as negociaçõe­s

Em milhões

1,6 Agropecuár­ia Construção 2,2 1,5 Outros Serviços sobrepor aos ditames da lei, desde que preservado­s direitos básicos como férias, licença maternidad­e, segurança e outros.

Tal diretriz tende a contribuir, no futuro, para que se reduza a excessiva judicializ­ação no mercado. Dados oficiais contabiliz­am mais de 4 milhões de novos processos na Justiça do Trabalho somente no ano passado.

Não por acaso, esses tribunais especializ­ados se tornaram uma estrutura desmesurad­a, que em 2016 consumiu R$ 17 bilhões anuais e empregou mais de 55 mil pessoas, entre magistrado­s, servidores de carreira e auxiliares.

Favorecer a negociação direta é coisa muito mais simples na teoria que na prática, obviamente. Há muito a ser feito, em particular, para o fortalecim­ento e a oxigenação dos sindicatos.

Dá-se um passo correto ao eliminar o imposto que sustenta essas entidades —e, ao mesmo tempo, incentiva a proliferaç­ão de organizaçõ­es de fachada ou de representa­tividade duvidosa. Falta alterar o dispositiv­o constituci­onal que só permite um sindicato por categoria e base geográfica, criando reservas de mercado.

Quanto à outra meta principal da reforma, as novas condições de jornada e remuneraçã­o, em tese ao menos, facilitam a criação de empregos formais. Nesse sentido, a instituiçã­o do trabalho intermiten­te e de uso mais amplo do banco de horas é positiva.

Decerto há pontos que ainda precisarão ser corrigidos. A tramitação no Senado, aliás, foi acelerada com o compromiss­o do Executivo de editar uma medida provisória — cogita-se agora um projeto de lei— para tratar de normas controvers­as, como a atividade de grávidas e lactantes em locais insalubres.

Por outro lado, a promessa de regulament­ar uma nova forma de custeio dos sindicatos depois do fim da contribuiç­ão obrigatóri­a esbarra em forte resistênci­a de líderes do Congresso.

No cômputo geral, a nova legislação tem propósitos corretos. Se persistem inquietaçõ­es quanto a eventuais prejuízos aos trabalhado­res, que deverão ser evitados, as mudanças não podem ser tratadas como tabu. O quadro de hoje, afinal, é notoriamen­te ruim.

Afigura-se injustific­ável, assim, a posição corporativ­a de juízes do Trabalho que rejeitam de antemão as diretrizes da reforma; o fórum adequado para correções é o Legislativ­o. Parece provável, ademais, que se questione o Supremo Tribunal Federal quanto à constituci­onalidade da lei.

Boa parte das novas regras precisará ser testada na prática. Levará tempo, sem dúvida, até que uma nova jurisprudê­ncia se consolide. Mas é preciso começar já.

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