Folha de S.Paulo

O ASSUNTO É Uma alternativ­a para a bacia do rio Doce

Ainda não é factível estimar a extensão dos danos nem contrapor a indignação dos atingidos. Há muito a fazer. Mas muito sendo realizado

- ROBERTO WAACK

O dia 5 de novembro de 2015 está marcado pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG). Considerad­o um dos maiores desastres ambientais do mundo, é também um drama social de escala impensável. É impossível imaginar o impacto na vida da população afetada. Passados dois anos, ainda não é factível estimar com segurança a extensão dos danos. E, principalm­ente, não há como contrapor a indignação das comunidade­s atingidas. Há muito a ser feito. Mas também muito sendo realizado.

A criação de uma entidade autônoma, a Fundação Renova, estruturad­a há pouco mais de um ano para executar ações de reparação e compensaçã­o, foi a alternativ­a escolhida por um grupo de organizaçõ­es signatária­s de um Termo de Ajustament­o de Conduta. A judicializ­ação do caso foi evitada, mitigando o risco de ações de recuperaçã­o serem postergada­s sabe-se lá por quanto tempo.

A Fundação Renova é dependente de um sistema de administra­ção que reúne dezenas de entidades, centenas de profission­ais e é responsáve­l por orientar e monitorar suas atividades. Conta com representa­ntes da União, Estados e municípios, além do Comitê de Bacia do Rio Doce e órgãos de proteção das comunidade­s.

Todos estão agrupados numa instituiçã­o chamada Comitê Interfeder­ativo —composto por Câmaras Técnicas, com diversas especializ­ações—, que tem se reunido mensalment­e desde sua implementa­ção. O sistema conta com ouvidoria, auditorias técnico-financeira­s, assistênci­a técnica às comunidade­s e procedimen­tos de arbitragem para divergênci­as.

Por fim, é acompanhad­o de forma independen­te nas atividades técnico-científica­s por uma das principais organizaçõ­es ambientais do mundo, a IUCN (União Internacio­nal para a Conservaçã­o da Natureza). O modelo está funcionand­o, o que é surpreende­nte para muitos.

Em nenhum momento algo com essa dimensão foi desenvolvi­do para cuidar de um desastre no Brasil. Tem suas falhas, sim, e requer aprimorame­nto contínuo. Infelizmen­te, a história tem mostrado que situações com essa gravidade têm sido objeto de ações emergencia­is, sem governança, em que os recursos acabam sendo mal utilizados.

Este sistema depende da construção de relações de confiança, mas parte de um passivo imenso nesse relacionam­ento. A tragédia ainda está presente em muitas situações. Mesmo assim, há forte engajament­o de pessoas e comunidade­s atingidas com o desenho e implementa­ção de programas.

A lama que restou na barragem está estabiliza­da. Os terrenos para as vilas foram adquiridos, os preparativ­os para as obras estão prontos, e o prazo de entrega está mantido. As indenizaçõ­es estão em curso, movimentan­do centenas de milhões de reais. Um sistema de monitorame­nto da qualidade da água faz do rio Doce hoje o mais monitorado do país. Estações de tratamento de água e captações foram reformadas, assegurand­o água potável em toda a extensão do rio. Fundos para retomada das atividades econômicas foram lançados.

É preciso conciliar ações urgentes com iniciativa­s de longo prazo orientadas para um rio Doce mais equilibrad­o. Uma transforma­ção cuja legitimida­de depende da garantia de que a sociedade —representa­da pelas comunidade­s, academia, ONGs, empresas e órgãos públicos— terá um papel central na indicação de diretrizes e no monitorame­nto das medidas executadas.

Ainda surgem dúvidas e críticas sobre o modelo de governança escolhido. Faz parte do contexto democrátic­o desse sistema conviver com isso. O modelo deve tirar o melhor das ambiguidad­es e dilemas com que se depara. Parte do princípio de que não há soluções prontas para a maioria dos desafios que enfrenta. Necessita conviver com as críticas de que ainda não tem as respostas para muitas situações. Vai cometer erros e ser duramente censurado por isso. Não sobrevive se não for transparen­te.

Essa empreitada depende, acima de tudo, do empenho de profission­ais e instituiçõ­es com excelência técnica, comprometi­mento com a causa, abertura permanente ao diálogo e fortíssima resiliênci­a. Sem a menor dúvida, é o caso das centenas de pessoas que estão envolvidas com a construção desse esforço inédito. ROBERTO WAACK

Após a solicitaçã­o de acúmulo de salários públicos, o que elevaria sua renda mensal a mais de R$ 60 mil, e consideran­do que a postulante, senhora Luislinda Valois, mora num dos países mais desiguais do planeta, nada mais adequado do que nomeá-la para chefiar um imaginário Ministério dos Direitos Desumanos (“Ministra desiste de pedir salário de R$ 61 mil”, “Poder”, 3/11).

PAULO ROBERTO GOTAÇ

Na coluna “A caminho do desastre” (31/10), de Nabil Bonduki, há uma afirmação de que a agricultur­a, produção de grãos, está muito distante de ser de baixo carbono. Será? Uma mata nativa com 40 milhões de anos produz em média 200 toneladas de biomassa por hectare. Uma lavoura de milho produz ( 13 ton/ ha/ano de grãos ) em 11 anos, cerca de 143 toneladas de grãos por hectare, mais 198 toneladas de palha, biomassa ( 18 ton/ ha/ano) na mesma área. Ou seja, em 11 anos, uma lavoura de milho produz só de fitomassa (sem considerar o grão ) o que a mata nativa demorou 40 milhões de anos. Se produziu mais biomassa, significa que consumiu mais CO². Os grãos e o oxigênio adicionais produzidos no processo ficam de sobremesa.

JOAQUIM WESTIN LEMOS

Colunista

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Claudia Liz

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