A recuperação é lenta. O ambiente de incerteza política
DE SÃO PAULO
Mais otimista do que a média do mercado, cuja previsão é de uma alta de 2,5% para a economia em 2018, Marcelle Chauvet espera que a atividade cresça 3,5% no ano que vem.
Mas, mesmo que esse percentual mais alto se repita no ano seguinte, o PIB (Produto Interno Bruto) só voltará ao pico registrado em 2014 nos primeiros meses de 2020, afirma Chauvet, que estuda os ciclos da economia desde o doutorado e ajudou a implementar um comitê sobre o assunto na Turquia.
A economista também destoa de seus pares ao não prever grandes abalos na economia em ano de eleições.
“O pior que poderia acontecer já aconteceu”, afirma Chauvet, sobre o impeachment de Dilma Rousseff e as suspeitas de corrupção que recaíram sobre o atual presidente, Michel Temer.
“Mesmo assim, o Brasil continua crescendo. Acho muito difícil ter choques negativos que possam tirar a economia do lugar.”
Professora-assistente da Universidade da Califórnia Riverside, Chauvet integra também o Codace, o grupo de sete economistas formado pela FGV e que data inícios e fins de recessão.
Há uma semana, o comitê informou que a recessão brasileira durou 11 trimestres e acabou no fim de 2016.
Folha - A economia tem mesmo ganhado tração ao longo deste ano?
Marcelle Chauvet - A recuperação não ocorre instantaneamente em todas as regiões, indústrias, setores. Mas, à medida que a economia vai se recuperando, o crescimento se torna mais robusto e fica mais visível nos dados agregados. A recuperação começou modesta, mas tem ganhado tração. A produção industrial e as vendas no comércio mostram uma aceleração, assim com o setor de serviços, apesar de apresentar alta mais modesta. O consumo das famílias puxa a retomada. Esse movimento parece sólido?
Sim, ele decorre de um cenário favorável que inclui inflação em queda, juros mais baixos, crédito à pessoa física earendadaliberaçãodoFGTS. Juntam-se isso a redução do desemprego e o desempenho positivo do mercado financeiro, o que leva a um ambiente de maior otimismo comparado com os últimos anos. Por que demoramos mais a perceber que a economia saiu da recessão?
Em geral, a percepção tende a ser mais negativa no fim de uma recessão, assim como otimista demais no fim de um período de expansão. Mas o meu modelo indica que a probabilidade de termos saído da recessão é grande, e isso independe de percepção. Mas alguns dados ainda estão bem fracos, não?
Normalmente, os períodos em que a economia está se recuperando são de muita incerteza, e incerteza leva a oscilação. É comum que alguns setores cresçam e outros não. E, se você olha dados agregados, esse crescimento pode ser pequeno. Num momento de recuperação, olhar o agregado pode ser desanimador. Que indicadores se destacam?
A produção de bens de capital já vinha indicando recuperação da indústria de transformação desde o fim do ano passado. Quando um investidor vê que um setor está indo bem, ele já se sente mais confiante em começar a investir no próprio setor, e uma coisa leva a outra. E, se forem setores ligados àquele investidor, melhor ainda. Ao mesmo tempo, vemos os investimentos ainda muito ruins. Por que o descolamento?
Tivemos uma recessão longa e muito forte, e há muito espaço para que o capital possa ser usado sem comprar máquinas novas. As indústrias estão usando o que já têm. E a construção civil?
Para fazer um empreendimento, é preciso muito empréstimo bancário, além de certa redução de incertezas. Logo, há algumas indústrias que seguram o investimento até que as coisas se recuperem com mais força. Fora que o setor também estava esperando a queda dos juros, cujo efeito demora alguns meses para ser sentido. Qual seria o ritmo da recuperação atual?
MARCELLE CHAUVET
economista