Recursos escassos aceleram avaliação de políticas públicas
Espírito Santo aprova lei que torna obrigatório acompanhamento de todos os projetos implantados
No governo federal, programa Criança Feliz será o primeiro a ter avaliação rigorosa dos resultados obtidos
Dar dicas de nutrição e brincadeiras para os pais melhora o desenvolvimento das crianças pequenas? A questão ganha relevância quando recursos públicos são destinados a promover visitas de profissionais de saúde a famílias carentes do país.
Para saber se o dinheiro investido em políticas públicas está sendo bem aplicado, é preciso medir de maneira sistemática os resultados, algo que começa a ganhar fôlego no Brasil, no embalo das restrições de receita provocadas pela crise econômica.
O governo federal e o de Estados como Espírito Santo e São Paulo têm desenvolvido sistemas próprios para fazer as chamadas avaliações de impacto. O modelo é inspirado nos testes feitos na medicina, em que um conjunto de indivíduos recebe um medicamento novo, e outro, um placebo (uma pílula de farinha, por exemplo).
Na avaliação de políticas, comparam-se indicadores de beneficiários dos projetos com os de indivíduos com características similares que ficaram de fora da intervenção —o chamado grupo controle. PRIMEIRA INFÂNCIA O Criança Feliz, lançado em 2016 com foco no desenvolvimento nos três primeiros anos de vida, é a primeira política social do governo federal em que dados para esse tipo de avaliação estão sendo coletados em larga escala.
Mais de mil municípios aderiram ao programa, cujo orçamento neste ano foi de R$ 328 milhões. Em 30 deles, em seis Estados, a evolução das crianças cujas famílias estão sendo visitadas e orientadas será comparada à das ainda não atendidas.
“Não conseguimos suprir toda a demanda nessa fase inicial de implementação”, diz Vinicius Botelho, que comanda a Secretaria de Avaliação (Sagi) do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).
A avaliação será feita por universidades federais contratadas pelo governo. Serão observados, por exemplo, a capacidade das crianças de segurar objetos e interagir com os pais. Os primeiros resultados saem no fim de 2018. OBRIGATÓRIO POR LEI No Espírito Santo, a análise regular do efeito das ações de governo virou lei, aprovada em setembro. O sistema específico de avaliação será coordenado pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN).
Foi o primeiro Estado do país a institucionalizar a avaliação em todas as suas esferas de atuação. “Às vezes, um pesquisador de fora idealiza uma avaliação, mas depois ele sai e tudo se desmonta. A vantagem da lei é que não fica atrelado a um governador ou a um momento político”, afirma Gabriela Lacerda, presidente do IJSN.
O projeto do governo capixaba prevê que indicadores relevantes de todos os seus programas sejam monitora- dos e que os resultados de três ou quatro políticas específicas passem por avaliações de impacto anualmente.
Para isso, serão formadas parcerias com centros como FGV Clear, Insper Metricis e o Instituto Ayrton Senna.
Outra novidade, importada do Reino Unido, é o contrato de impacto social, que está sendo formulado pelo governo de São Paulo com BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), Insper Metricis, Banco Mundial e a ONG britânica Social Finance.
O objetivo é complementar as políticas do governo para melhorar a qualidade do ensino médio. O programa está sendo formatado e será submetido a consulta pública. GABRIELA LACERDA presidente do IJSN, que vai avaliar as políticas públicas do Espírito Santo GUILHERME LICHAND fundador da MGov, empresa que avalia impacto de políticas públicas
SÉRGIO LAZZARINI
coordenador do Insper Metricis É a mensuração do resultado de determinada política em variadas áreas, como educação, saúde, distribuição de renda e proteção ao ambiente O QUE BUSCA DESCOBRIR? Se o programa teve efeito na vida de seus beneficários. Para isso, é preciso estimar também o que teria ocorrido com eles sem a intervenção
Edital convocará para a apresentação de propostas. A organização vencedora terá de cumprir metas, que devem incluir um percentual de redução anual da taxa de evasão escolar. O pagamento dependerá desse e de outros indicadores mensurados em avaliações de impacto.
A equipe envolvida no projeto evita falar em prazos para o lançamento do edital:
“Por ser uma novidade, a definição da estruturação jurídica foi um desafio, mas esperamos finalizar brevemente essa questão”, diz Thiago Arruda, assessor da Secretaria de Governo do Estado. PRECEDENTES Essa forma de análise técnica do resultado de políticas já ocorria no país, mas isoladamente, em projetos-pilotos desenhados por instituições externas, que também cuidavam de avaliar o impacto.
Agora, começa a ser vista como parte do dia a dia da gestão pública, ainda que os avanços sejam modestos.
Um deles foi a criação do CMAP (Comitê de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas Federais), no início do ano passado. O grupo, ligado a vários ministérios, fez um pente-fino em programas como o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada e o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil), levando a corte de gastos considerados indevidos.
Embora a revisão feita pelo comitê seja considerada um passo importante, ainda falta no Brasil, em nível federal e na maioria dos Estados, sistemas como o de Reino Unido, Canadá, México e Chile, em que os objetivos de cada política são definidos previamente e a mensuração é institucionalizada.
Um projeto de lei que busca avançar nessa direção foi aprovado pelo Senado em 2016, mas desde então está parado na Câmara.
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Às vezes, um pesquisador idealiza uma avaliação, mas depois sai, e tudo se desmonta. A vantagem da lei é que não fica atrelado a um governador ou a um momento político No Brasil ainda se confunde alcance —chegou a tantos milhões de pessoas— com impacto A demanda social por resultados é muito forte hoje. A juventude está preocupada com essas questões