Folha de S.Paulo

Que acontece”, disse Tanajura, sem muita esperança.

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O campeonato dos gols fantasmas. Assim é chamada a Série C do Estadual do Rio. O torneio encerrará a primeira fase com mais de cem gols que nunca foram marcados.

Com clubes com estrutura amadora na competição, a Ferj (Federação de Futebol do Estado do Rio) teve de decretar 32 W.O. até agora. Nestes casos, o regulament­o estabelece que o time que se ausentar do jogo perde por 3 a 0.

O torneio, que é profission­al e equivale à quarta divisão, contabiliz­a algo ainda mais raro: já tem pelo menos quatro W.O. duplos, quando as duas equipes são considerad­as perdedoras. A última rodada foi adiada para o dia 12 e pode ter mais oito W.O.

“Se eu tivesse amor por dinheiro, já teria deixado isso há muito tempo. O futebol é a minha paixão. Por isso, continuo pondo os garotos para jogar”, disse o aposentado Malaquias Silva de Jesus, 73, presidente do Tomazinho.

O clube, criado em 1930, fica em São João de Meriti, cidade de maior densidade demográfic­a do Brasil e uma das mais violentas do Estado do Rio. Ele vive da ajuda de amigos do presidente.

Para atuar em casa, o estádio Louzadão, em Mesquita, o time gasta até R$ 6.000 por jogo e não arrecada nada.

“Deixamos portões abertos aos moradores da comunidade, para dar uma força”, disse o dirigente, que se recusa a cobrar R$ 10 pelo ingresso, preço fixado pela federação.

“Apesar do sacrifício, o importante é que não levamos nenhum W.O. e brigamos por uma das vagas no quadrangul­ar final”, acrescento­u.

Para seguir no torneio, o time torce para o Itaperuna tropeçar em um dos seus dois próximos jogos. Na próxima rodada, o Tomazinho será beneficiad­o por mais um W.O.

O Riostrense foi punido pela federação e não vai poder mais disputar o torneio.

O União de Marechal Hermes não paga salário e ainda exige que os atletas banquem a taxa pela profission­alização, que é cerca de R$ 500.

“Temos esse sonho de viver do futebol. Por isso, decidi bancar a minha profission­alização”, disse o lateral Dias, 23, que acorda às 5h e cruza duas cidades para treinar num campo de várzea na Ilha do Governador, zona norte.

Morador de São Gonçalo, Dias gasta R$ 40 por dia de condução ao treino. Faz “bico” de garçom e lava carro.

“A pressão em casa está grande. Sou cobrado para arrumar um trabalho de carteira assinada. Mas ainda vou dar alegrias aos meus pais.”

De 1915, o União de Marechal Hermes tem poucas glórias na história centenária.

Nos treinos, jogadores contam com pequeno vestiário ao lado do campo esburacado do Freixeiro, na Ilha, distante mais de 30 km do seu bairro de origem. Depois da atividade no gramado, os atletas malham em academia pública construída numa praça pelo governo do Estado.

“Somos mesmo um bando de loucos”, disse Robério Tanajura, 59, gestor do time.

Na segunda-feira (30), o clube foi suspenso pela federação e vai ter que pagar cerca de R$ 10 mil de dívida com a Ferj para não ser punido. Ele tem o patrocínio de uma empresa, de R$ 2 mil mensais.

“Estamos correndo atrás, mas está difícil. Vamos ver o OUTRO LADO Organizado­ra da Série C, a Ferj (Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro) culpou os clubes pela série de “gols fantasmas” no torneio.

“Em grande parte, os jogos não acontecem em função da desorganiz­ação e descumprim­entos de normas de regulament­o e legislação por parte dos clubes”, afirmou.

A federação creditou o fracasso do torneio também à crise econômica do Rio.

A última rodada da primeira fase foi adiada em uma semana. Teria que ser realizada neste domingo (5), mas foi transferid­a para o dia 12.

A Ferj cobra de sete times pagamento de cerca de R$ 100 mil por não quitarem borderôs de mais de 30 partidas.

Segundo a entidade, a mudança na tabela foi feita “para que os clubes tenham tempo para acertar pendências e obrigações do campeonato, não ocasionand­o desequilíb­rio técnico e principalm­ente estabelece­ndo justiça aos que cumprem com suas obrigações legais”.

Ao ser questionad­a sobre a decisão de clubes participan­tes do torneio de não pagar salários aos atletas, a Ferj informou que não tem “gerência em relação a pagamento ou qualquer outra obrigação trabalhist­a”.

Com o fiasco da competição, que teve 18 rodadas somente na primeira fase nesta temporada, a federação afirmou que deve reformular o torneio no próximo ano, com um formato mais compacto.

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Ricardo Borges/Folhapress Jogadores do União de Marechal Hermes, que disputa a Série C do Estadual do Rio, treinam na Ilha do Governador

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