Folha de S.Paulo

Ex-procurador orientou JBS em delação, sugere e-mail

- CAMILA MATTOSO RANIER BRAGON

DE BRASÍLIA

A quebra do sigilo de e-mail de Marcello Miller revela que o ex-procurador da República tinha em sua caixa de mensagens um roteiro com orientaçõe­s sobre como os executivos e advogados da JBS deveriam se portar para fechar o acordo de delação premiada com a PGR (Procurador­ia-Geral da República).

A Folha teve acesso a um e-mail de 9 de março de 2017, dois dias após o empresário Joesley Batista gravar o presidente Michel Temer no Palácio do Jaburu. O texto sugere que a Procurador­ia já sabia que Temer estaria entre os delatados no dia em que foi gravado.

Intitulada “segundo roteiro de reunião”, a mensagem traz cinco temas para serem tratados em reunião com a PGR com frases literais para representa­ntes da JBS usarem.

A orientação capital à JBS era reforçar a disposição da delação, no sentido de evitar medidas judiciais.

“Queríamos lembrar a vocês que a nossa colaboraçã­o é muito relevante. Estamos trazendo pela primeira vez BNDES, que era a última caixa preta da República, estamos trazendo fundos, Temer, Aécio, Dilma, Cunha, Mantega e, por certo ângulo, também Lula”, diz o roteiro, citando políticos do atual governo e do anterior.

O documento foi encaminhad­o pelo próprio Miller para um e-mail pessoal às 8h16 de 9 de março de 2017.

A mensagem contrasta com a versão apresentad­a até agora por Miller, pela JBS e pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot.

Comandada por Janot, a delação da JBS sofreu um abalo após virem à tona gravações levantando a suspeita de que Miller trabalhou como advogado da empresa enquanto ainda estava no Ministério Público, apenas alguns meses depois de ter integrado a equipe do então procurador-geral.

Miller, até então, afirmou que apenas fez reparos “linguístic­os e gramaticai­s” em uma espécie de esboço do anexo de delação que foi apresentad­o a ele por Ricardo Saud, diretor de Relações Institucio­nais do grupo J&F.

No segundo item do e-mail, porém, há uma orientação claramente calçada na experiênci­a de como é o funcioname­nto do Ministério Público.

O roteiro sugere aos executivos da JBS que cobrem da PGR o enquadrame­nto de outros integrante­s do Ministério Público que, alheios às negociaçõe­s em torno da delação, estariam agindo contra os interesses do grupo —a mensagem foi enviada um dia depois da prisão de um ex-sócio de Joesley. Mas prevê como resposta a afirmação de que os procurador­es são independen­tes em sua atuação.

Como tréplica, sugere: “O MP não tem só a independên­cia funcional como princípio, tem também a unidade. Numa situação dessas, que exige coordenaçã­o entre instâncias, No dia 7 de março, dois dias antes do e-mail, Joesley Batista gravou Michel Temer no Palácio do Jaburu. O áudio foi um dos pilares das denúncias contra o presidente apresentad­as pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot

1)

No dia 8 de março, Mario Celso Lopes foi preso na Operação Greenfield, que investiga fraudes em fundos de pensão. Lopes foi sócio de Joesley na Eldorado Celulose, do grupo J&F E-mail diz que JBS já tinha se apresentad­o nessa data à colaboraçã­o. Janot afirmou que antes do dia 27 de março não houve nenhuma tratativa, nem de forma direta nem indireta

2)

era razoável poder contar com um mínimo de unidade. E eu acho que a implementa­ção disso estava sem tanta dificuldad­e ao alcance de vocês”, diz o texto.

A JBS e Janot sustentam que Temer não era objeto das conversas iniciais e que os supostos crimes cometidos pelo presidente da República só vieram a integrar as tratativas no final de março.

A afirmação se choca com o e-mail descoberto na caixa de mensagens de Miller, claro ao afirmar que semanas antes a JBS estava, em sua delação, tratando de Temer.

A importânci­a sobre quan- “SB” refere-se ao promotor Sérgio Bruno, integrante do grupo de trabalho de Janot. PRDF é referencia à Procurador­ia do DF, que tinha pedido a prisão de Mario Celso Lopes A JBS diz que apresentou 13 itens em uma proposta de delação para a PGR, mas que eram temas genéricos e não detalhava os envolvidos. A versão da empresa até o momento é de que o nome de Temer só foi levado a procurador­es no momento em que a gravação de Joesley foi mostrada, no final de março do Temer passou a ser objeto da delação diz respeito a questões jurídicas e políticas.

O presidente e seus aliados afirmam que o ex-procurador-geral tinha o objetivo político de derrubar o governo e que, por isso, induziu e orientou de forma ilegal toda a produção de provas.

Janot afirma que todas as acusações contra o presidente —denunciado pelos crimes de corrupção passiva, organizaçã­o criminosa e obstrução da Justiça— foram apresentad­as de forma espontânea pelos executivos, —prérequisi­to para as delações serem considerad­as válidas.

As acusações contra Temer foram barradas na Câmara, após pressão do governo sobre aliados. Com isso, o caso contra o presidente só voltará a tramitar após o fim do seu mandato, que se encerra em dezembro do ano que vem.

Após vir à tona gravação supostamen­te acidental em que Joesley indica ter omitido informaçõe­s da PGR, Janot —que encerrou o mandato em setembro— pediu ao STF a suspensão do acordo de delação, e Miller passou a ser investigad­o por Ministério Público e Polícia Federal.

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» VERDÃO Uma espuma se alastrou nesta terça-feira (7) no espelho d’água do Palácio do Planalto, em Brasília; ela se formou devido a uma mudança no pH da água, que foi causada pelo grande volume de chuvas durante a madrugada

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