Protestos a favor e contra filósofa tomam rua em SP
Teoria de gênero era o tema dos manifestantes de ambos os lados, mas não o da palestra de Judith Butler
Professora americana está no Brasil para lançar livro e participar de ciclo de palestras sobre democracia
Dentro do teatro do Sesc Pompeia, onde Judith Butler fazia uma conferência na manhã de terça (7), a teoria de que os gêneros foram até hoje determinados por situações culturais, e não pelo sexo não esteve em pauta.
Mas a filósofa norte-americana não escapa da associação ao tema —de fato importante em sua produção—, que mobilizou dezenas de manifestantes na rua em frente ao centro cultural.
Ao lado de cartazes que defendiam que “meninos são meninos”, outros traziam a pauta política, dizendo que a Operação Lava Jato está “passando tudo a limpo”.
Religiosos e militares se mostravam numerosos entre os manifestantes que recusam a ideia de que alguém nascido com genitais masculinos pode se perceber como mulher e vice-versa.
Do outro lado do portão de entrada, um grupo mais numeroso defendia a liberdade de afirmação de gênero e da sexualidade.
Houve provocações de ambos os lados; no ápice do protesto, os manifestantes de direita queimaram uma boneca caracterizada como bruxa que trazia, à guisa de rosto, um retrato de Judith Butler.
Os protestos aconteceram após uma petição on-line reunir mais de 300 mil assinaturas pedindo o cancelamento do evento. A palestra, porém, não sofreu qualquer tipo de interferência. Policiais militares circulavam pelos corredores do Sesc. DEMOCRACIA No teatro, Butler nem sequer mencionou a teoria de gênero. Sua participação no seminário “Os Fins da Democracia” se concentrou em questões relacionadas às representações nos governos e aos sentidos estabelecidos pela chamada teoria crítica.
Grosso modo, a teoria crítica é uma abordagem do começo do século 20, desenvolvida pelos pensadores da Escola de Frankfurt como uma forma de estruturação do pensamento diante da ascensão política do proletariado —mas também do autoritarismo, a partir da Revolução Francesa.
Butler chamou atenção para a frequência com que “termos-chave”, tais como “autoritarismo” e “fascismo” são usados, “sem que se realize o trabalho paciente de entender o que significaram, o que significam e como mudaram”.
Ela fechou sua fala com uma questão sobre a democracia. “É algo que pode ser alcançado, uma vez que é para todos, ou é um processo que não se completa, tendo como princípio que um ideal não encontra sua forma final?”
A sessão foi a segunda fala de Butler nesta visita ao país. Na segunda (6), ela foi à Unifesp para falar sobre o tema de seu livro “Caminhos Divergentes: Judaicidade e Crítica do Sionismo” (Boitempo, R$ 46,70, 240 págs.).
Ali, ela defendeu que criticar o sionismo ou a atuação política do Estado de Israel que resultou no confinamento de palestinos em Gaza não é o mesmo que criticar o judaísmo. Uma mulher saiu da palestra gritando “protejam nossas crianças” (contra a teoria de gênero).
Butler não parou de repetir a palavra “coabitar”. Se “o momento mais extremo da hostilidade pode resultar em um assassinato”, a verdadeira compreensão do sentimento de “coabitar” é o que pode impedir a violência, diz.