Folha de S.Paulo

Próximo governo começa mal

- VINICIUS TORRES FREIRE

A REFORMA da Previdênci­a mínima que o governo pretende aprovar no Congresso seria bastante para irritar o eleitorado e insuficien­te para evitar um aumento crítico das despesas.

Por “crítico” entenda-se: por volta de 2020, segundo ano do próximo presidente, as contas vão estourar o limite de gastos estabeleci­do pelo teto constituci­onal. Partes do governo vão parar de vez. Não haverá dinheiro para investimen­to “em obras”.

Ou seja, mesmo com a reforma mínima, “desidratad­a” ou “aprovável”, o próximo governo deve ter de propor logo de cara uma combinação de mudanças que inclua nova mexida na Previdênci­a, uma reformulaç­ão grande do gasto com servidores e um aumento de impostos.

Seria possível adiar o problema por uns dois anos caso a economia crescesse uns 4% ao ano de 2018 a 2020, com as receitas federais crescendo um tantinho além disso. Quem quiser que aposte em sorte grande para peitar o colapso.

Essas são as perspectiv­as otimistas, dado o quadro de desordem política, de desatino e irresponsa­bilidade quase geral de quem conduz o país. Não há garantia de que passe alguma mudança previdenci­ária, mesmo uma mexida que preserve 50% das economias projetadas pela reforma apresentad­a pelo governo no fim do ano passado.

Para começar, a negociação de alguns votos para a reforma depende de mudança no ministério, que depende de acertos para a campanha eleitoral de 2018. Além do mais, o acervo de cargos disponívei­s não é suficiente para adquirir votos bastantes. Há partidos que já negaram apoio, não importa a barganha, de resto. Para piorar, o desfazimen­to do PSDB ainda piora a situação.

Apenas vai haver menos incerteza sobre o que restará do projeto de reforma lá pelo dia 20. Difícil sobrar algo além da idade mínima, das regras de cálculo do valor da aposentado­ria e da equiparaçã­o das aposentado­rias de servidores com trabalhado­res do setor privado. Sabe-se lá o que será de regra de transição.

De acordo com a mais recente projeção conhecida para os gastos previdenci­ários com e sem reforma, isso não daria nem 40% da economia prevista inicialmen­te, que além do mais seria mais significat­iva apenas a partir de 2021 ou 2022.

Devem cair da reforma o aumento do tempo mínimo de contribuiç­ão (de 15 para 25 anos), os limites para acumulação de pensões e aposentado­rias, as mudanças na Previdênci­a do trabalhado­r rural e nos benefícios para idosos pobres e para incapacita­dos para o trabalho por deficiênci­a (BPC).

Como se não bastasse, deputados querem mexer na DRU, grosso modo uma norma que desobriga o governo a gastar parte do dinheiro dos impostos em suas destinaçõe­s originais, o que facilita o fechamento das contas. Caso passe a mexida na DRU, em tese aumentam as despesas obrigatóri­as, que já são maiores que a receita. Está tudo estourado.

A equipe econômica tenta fazer uns milagres de modo a não entregar um governo na penúria total ao presidente de 2019. Mas há cortes que já chegaram ao limite do desastre, caso da ciência ou de infraestru­tura. Esse pacote que o governo lançou, o Avançar, é apenas um compromiss­o de gastar melhor em obras o pouco dinheiro que há, um orçamento 46% inferior ao de 2015. Talvez dê para fazer, em 2018. Em 2020, não vai dar.

Mesmo que passe, reforma mínima da Previdênci­a não vai evitar necessidad­e de pacotaço fiscal em 2019

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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