Folha de S.Paulo

É para chorar mesmo

- MARILIZ PEREIRA JORGE COLUNAS DA SEMANA segunda: Juca Kfouri e PVC, quarta: Tostão, quinta: Juca Kfouri, sábado: Mariliz Pereira Jorge, domingo: Juca Kfouri, PVC e Tostão

NEYMAR CHOROU na entrevista coletiva ao ser defendido por Tite. Nem falo mais nada sobre essa fragilidad­e irritante dos jogadores da seleção. Que preguiça. Mas se é para chorar, tenho motivos reais. Apesar da vitória, o futebol brasileiro não teve muito o que comemorar nesta semana.

A justiça tarda, mas não falha. Pelo menos a americana. Dois anos e meio depois de ser preso na Suíça, começou em Nova York o julgamento do ex-presidente da CBF, José Maria Marin. Na mesma ação estão enrolados outros dois ex-dirigentes da Fifa, Manuel Burga, ex-presidente da Federação Peruana, e Juan Ángel Napout, ex da Conmebol.

É para chorar de vergonha saber que a defesa de Marin tentou convencer a Justiça americana de que as leis brasileira­s deveriam ser levadas em conta no julgamento. Pela perspectiv­a apresentad­a não existe corrupção privada. Na prática, Marin quer mostrar que no Brasil não é crime receber milhões em propinas para beneficiar empresas de marketing esportivo.

Uma bela sacada da defesa, levando em conta que o ex-presidente da CBF jamais foi penalizado pela Justiça brasileira. O mesmo argumento foi usado pelos advogados dos outros dois réus. Não colou. Aqui pode ser bagunça, mas nos EUA, não. A pena pode chegar a 60 anos de prisão, se o júri chegar à conclusão de que são culpados de corrupção, lavagem de dinheiro e grupo conspirató­rio (primo da formação de quadrilha).

É para chorar ter que lembrar que outros dois cartolas brasileiro­s também foram indiciados pela Justiça americana. Mesmo sem terem sido julgados, estão ao menos condenados a uma espécie “prisão domiciliar”, porque não podem sair do país, sob o risco de serem presos.

Ricardo Teixeira acumula ainda um processo e um pedido de prisão na Espanha. Há pouco mais de uma semana, a Justiça espanhola autorizou a transferên­cia do inquérito contra ele para o Brasil. O pedido é da Procurador­ia Geral da República, que assumiu o compromiss­o de investigá-lo e processá-lo. Em junho, numa entrevista à Folha, Teixeira disse que “não há lugar mais seguro para estar do que o Brasil e que não tinha do que fugir, se aqui não é acusado de nada”. Parece que o jogo está mudando.

Mas o que é de chorar mesmo é a notícia que vem circulando desde o começo da semana de que Marco Polo Del Nero, o outro indiciado nos Estados Unidos, o outro que não pode viajar, deve antecipar as eleições para a presidênci­a da CBF em um ano, para abril de 2018. O mandato dele terminaria em 2019. Então, você se pergunta: por quê? Para garantir uma eleição com chapa única, ainda antes da Copa de 2018, com mandato até 2022.

Isso tudo sem falar na baixa popularida­de que o futebol enfrenta cada vez mais. “Eu nem sabia que tinha jogo da seleção”, ouvi meu vizinho de esteira dizer ao professor da academia, enquanto a bola rolava em todas as TVs espalhadas pela sala. Com exceção da minha pessoa que, por motivos profission­ais, acompanhav­a o jogo, todas as outras estavam mais interessad­as em correr atrás de um corpão para exibir no verão do que acompanhar a vitória do Brasil contra o Japão.

Já disse e repito, muito mais gente vai comemorar a condenação de cartola do que gol da seleção. Mas é de chorar que dependamos da Justiça estrangeir­a para se fazer justiça por aqui.

Apesar da vitória da seleção, o futebol brasileiro não teve muito o que comemorar nesta semana

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