Venezuela adia possível declaração de calote
Em reunião com investidores, governo não faz proposta concreta sobre renegociação de dívida de petroleira estatal
Órgão internacional também posterga para terça (14) decisão sobre anúncio de default do país sul-americano
A decisão da Associação Internacional de Swaps e Derivativos (Isda, na sigla em inglês) de adiar a declaração de calote ou não da Venezuela transformou o que poderia ser uma segunda-feira (13) turbulenta em mais um dia de expectativa e suspensão.
A entidade, que congrega os principais atores do mercado financeiro global e cujas decisões podem desencadear uma série de mecanismos legais contra um país em calote, se reúne mais uma vez nesta terça-feira (14) para tratar do assunto.
Se ela considerar que a Venezuela não cumpriu o acordado no pagamento de juros e de parcelas de papéis emitidos pela PDVSA, a gigante petroleira que sustenta o país, o default será declarado. O diagnóstico, seja ele qual for, será controverso e deverá movimentar os mercados emergentes.
Apesar de não ter observado o prazo de pagamento de juros de títulos da PDVSA, que venceu na semana passada, a Venezuela efetuou o depósito de quase US$ 1,2 bilhão aos investidores no último fim de semana.
Como o fez fora da data estipulada, a maior parte dos analistas crê que a Isda vá declarar o país em default, apesar de, na prática, ele ter cumprido seus compromissos.
“Será uma decisão técnica, que vai impactar os detentores de CDS (Credit Default Swap), mas não acelerará a cobrança das dívidas futuras nem abrirá espaço para ações judiciais no mercado americano”, diz o economista Luis Vicente León, presidente da consultoria Datanalisis.
Os detentores dos CDS, uma espécie de seguro contra o risco de calote em papéis de dívidas, soberanas ou não, no mercado financeiro, estão pressionando a Isda a declarar a Venezuela em default para poder receber os prêmios estipulados nas apólices.
“Eles, é claro, são os mais interessados nisso agora, mas haverá impacto em todo o mercado [se a associação se decidir pela declara- ção de calote] e será ainda mais difícil para a Venezuela conseguir novos aportes para manter o país minimamente abastecido”, diz o também economista José Toro Hardy, ex-diretor da petrolífera estatal. TAPETE VERMELHO Na segunda, em Caracas, entre 60 e cem detentores de títulos da PDVSA foram recebidos com tapete vermelho, suco e arepas pelo governo venezuelano. Eles atenderam ao chamado do ditador Nicolás Maduro, que pretende renegociar a dívida externa de US$ 60 bilhões da estatal petroleira.
Maduro havia declarado, no domingo (12), que 400 investidores haviam confirmado presença no encontro e que a Venezuela jamais entraria em default.
A expectativa era de que, na reunião, o governo apresentasse propostas sobre como pretende pagar seus compromissos de curto e longo prazo. Mas, ao que parece, nada disso aconteceu.
De acordo com investidores que participaram do evento, o vice-presidente, Tareck El Aissami, e o ministro das Finanças, Simón Zerpa, apenas leram uma nota e prometeram que mesas técnicas serão montadas para discutir como será feita a restruturação da dívida.
“Não propuseram nada, foi uma oportunidade perdida”, afirmou à agência Reuters um dos investidores que participou do encontro. BRASIL CREDOR Também na segunda, o Brasil comunicou ao Clube de Paris que a Venezuela entrou em default por não pagar uma parcela de US$ 262 milhões da dívida de US$ 1,5 bilhão que tem com o país. Em janeiro de 2018, uma nova parcela, esta no valor de US$ 270 milhões, também vence.
Enquanto o mercado financeiro acompanhava atento o desenrolar da crise financeira do país, a União Europeia aprovou uma série de sanções contra a Venezuela. A principal medida é a proibição da venda ao país de armas e equipamentos de defesa que possam ser usados na repressão à população civil.
Ativos de integrantes do governo de Nicolas Maduro também foram congelados.
Nas ruas de Caracas, a população permanecia alheia ao futuro do país na ciranda financeira global. Com o dólar disparando diante da possibilidade de o país se tornar inadimplente, as apostas giravam em torno de quanto o papel americano estaria valendo ao final do ano.
Apenas nos últimos 12 meses, o bolívar, moeda do país, perdeu 96,55% de seu valor, ajudando a ampliar ainda mais a inflação, que deve fechar o ano acima de 1.000%. O valor do salário mínimo, sem o bônus de alimentação, despencou para o equivalente a US$ 4,3.
“Nisso tudo, uma coisa apenas é certa”, diz o economista Luis Vicente León. “O próximo ano será muito pior do que esse. Sobre isso, não há dúvidas.”