Folha de S.Paulo

Hoje fantasma, vila histórica será restaurada no litoral sul da Bahia

Recuperaçã­o de imóveis é tocada por fazendeiro­s e tem apoio de moradores e visitantes

- RAFAEL BALAGO

ENVIADO ESPECIAL A ILHÉUS (BA)

Rio do Braço é mesmo uma cidade fantasma. Ali, uma dezena de construçõe­s abandonada­s há décadas, parcialmen­te desmoronad­as e tomadas pelo mato, ladeiam uma estrada de terra a 36 km do centro de Ilhéus, na Bahia.

Lucas Kruchewsky, 38, vê esses prédios, que marcaram sua infância: havia ali cartório, posto de saúde, uma rádio comunitári­a, uma igreja e um chafariz. Nos últimos anos, ele se dedica a recuperar Rio do Braço e a tentar transforma­r o lugar em um destino turístico e histórico, com recordaçõe­s do auge do ciclo do cacau na Bahia.

Encruzilha­da entre estradas que levam às plantações, o Rio do Braço era um dos pontos de escoamento da produção. A estação foi aberta em 1911. Tropas de mulas carregavam os frutos até o local, de onde partia o trem até Ilhéus, no litoral.

Nos anos 1950, a operação da ferrovia foi repassada dos ingleses para o Estado da Bahia. Com problemas estruturai­s, o ramal foi fechado na década de 1960.

Vinte anos depois, a produção de cacau na Bahia foi duramente afetada pela praga vassoura-de-bruxa, um fungo que dizimou plantações e riquezas locais e contribuiu para que muitas pessoas deixassem a região.

Hoje, as plantações foram recuperada­s, e frutos coloridos são vistos atrás das cercas das fazendas.

Lucas é neto de Alcides Kruchewsky, coronel filho de imigrantes prussianos que foi dono de fazendas ao redor do Rio do Braço. Quando adulto, Lucas decidiu morar na Chapada Diamantina (BA). Lá criou um negócio de aluguel de cavalos para trilhas e planejava abrir uma pousada.

Em 2010, no entanto, seu pai, Fernando, o procurou e pediu que ele voltasse para casa. A fazenda da família passava por dificuldad­es.

Ele aceitou o chamado, começou a recuperar a propriedad­e ajuda a custear as reformas e restauraçõ­es.

A igreja de São Sebastião, que estava sem teto e sem algumas paredes, mas ainda com o altar, é o segundo prédio a passar por reformas.

“Em novembro, se não chover muito, devemos acabar de consertar o telhado e a sacristia”, planeja Lucas.

Quando a igreja for refeita, poderá receber casamentos. Também há planos de fazer feiras mensais de produtos cultivados por pequenos agricultor­es dos arredores.

Lucas estima que sejam necessário­s R$ 1,2 milhão para recuperar todos os 14 prédios da vila. “A gente não tem verba pública, nem empresário­s toparam ajudar.”

No ano passado, em meio ao processo de recuperaçã­o, o pai de Lucas, já octagenári­o, morreu alguns dias após a primeira festa de São João feita na estação.

“Meu pai me ensinou a cozinhar, a fazer móveis, a lidar com as plantas. Estou usando muitas coisas que aprendi com ele para recuperar esse lugar”, conta Lucas, com o filho Bento, 8, ao seu lado. RAFAEL BALAGO

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Construçõe­s abandonada­s em Rio do Braço, na região de Ilhéus (BA); cidade foi um dos pontos de escoamento do cacau entre as décadas de 1910 e 1960

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