‘Presidente’ da república armênia do Imirim
Ninguém entendeu nada na hora de planejar o enterro daquele primo: era só o terceiro membro da família a morrer desde que o sepulcro dos Sarkissian, com capacidade para oito caixões, fora comprado. No entanto, o defunto da vez estava sobrando —todas as covas estavam ocupadas.
O motivo não era surpreendente. Sarkis, o proprietário da tumba, cedera as covas para armênios que literalmente não tinham onde cair mortos.
Era mais um dentre os vários favores que prestava à comunidade: se alguma família fosse despejada, ele oferecia teto de graça em um de seus imóveis; nos registros da sua fábrica, constavam funcionários que nunca deram expediente —mas que, já idosos, precisavam cumprir o tempo de aposentadoria.
Industrial calçadista, diretor do Externato José Bonifácio e do Clube Marachá, bastiões armênios em São Paulo, Sarkis só era chamado de “Presidente” no bairro do Imirim, na zona norte.
Filho de refugiados do genocídio cometido pelo Império Turco-Otomano, começou a trabalhar aos sete anos, mascateando amendoim.
Ainda jovem, conseguiu abrir uma pequena confecção, no final dos anos 50. Foi evoluindo: mudou-se para um galpão maior, ampliou a linha de produtos e, com a marca Paloma, entrou no varejo.
Com a abertura da economia para as importações durante o governo Collor, fechou a lojinha em 1992. Nos bares e praças do Imirim, no entanto, o título honorífico nunca foi aposentado.
Morreu no dia 6, aos 85, após uma infecção intestinal. Deixa mulher, três filhos, seis netos e cinco bisnetos. coluna.obituario@grupofolha.com.br 1º MÊS 12º ANO Sra. do Brasil, 1, Jd. América.