Folha de S.Paulo

Os sem-voto e os sem-máquina

- CELSO ROCHA DE BARROS

ENTRE AS muitas coisas que farão a eleição de 2018 ser diferente das anteriores está o fato de que, pelo que indicam as pesquisas, quem tem voto não tem máquina, e quem tem máquina não tem voto.

A coalizão de Temer deve ter candidato. É improvável que essa turma bacana desista fácil de ser governo, no mínimo pelo que isso lhes ajuda a seproteger­emdaLavaJa­to.Umachapa PMDB/centrão teria o apoio da máquina federal, e isto é uma senhora vantagem: depois de Collor, o único candidato de oposição a vencer a eleição presidenci­al foi Lula em 2002.

Entretanto, embora tenha a maior máquina de todas, os governista­s, até agora, não têm voto. Nenhum dos candidatos no pelotão de frente das pesquisas apoia o governo. Deve haver um candidato governista em 2018: mas esse candidato ainda não tem nome.

O PSDB tem, sem dúvida, uma máquina partidária respeitáve­l, e controla a poderosa máquina estadual paulista. No entanto, seu candidato mais forte, Geraldo Alckmin, ainda não decolou nas pesquisas.

Não é à toa: a situação do partido é a pior desde sua criação. Aécio Neves está no centro da Lava Jato, e virou símbolo das vitórias do sistema contra a Lava Jato. Mesmo se sair do governo Temer, terá saído tarde, e pode sofrer algum contágio da impopulari­dade peemedebis­ta.

Já Bolsonaro e Marina têm muitos votos, mas não têm máquina. Seus partidos são minúsculos. Não contarão com a estrutura de campanha nacional que os partidos for- tes costumam garantir a seus membros. Não terão tempo de TV ou uma fatia generosa do fundo partidário. O mesmo vale para Luciano Huck, caso concorra pelo PPS, e para Ciro Gomes, pelo PDT.

A exceção parcial a este padrão é Lula, que tem muito, muito voto, e tem o PT. Os petistas estão na oposição, não contam com apoio de máquinas públicas importante­s (por isso a exceção é parcial), mas têm estrutura na- cional. E contam com o trunfo de serem a oposição mais visível a Temer.

Entretanto, a expectativ­a é que Lula seja impedido de concorrer pela Justiça. Parece ser a expectativ­a da esquerda, inclusive: o PC do B, que sempre apoiou o PT nas eleições presidenci­ais, lançou pré-candidata própria, Manuela D’Ávila (outra que pode até conquistar votos, mas não terá máquina).

Enfim, é como dissemos no início: ao menos até agora, há candidatos com máquina, há candidatos com voto, não há candidatos com máquina e voto.

Não é por acaso: a Lava Jato desmoraliz­ou as máquinas partidária­s, e o governo federal atual tem como prioridade escapar da cadeia. É justamente porque as máquinas perderam credibilid­ade que o apetite por candidatur­as “outsider” é maior.

As redes sociais substituir­ão os mecanismos tradiciona­is de propaganda? Políticos locais abandonarã­o as máquinas partidária­s tradiciona­is e apoiarão novatos com mais votos? A incomparáv­el exposição de mídia de Luciano Huck compensará a falta de estrutura? Os militantes entusiasma­dos de Marina, Ciro ou Bolsonaro farão diferença? Ninguém tem a menor ideia. Embora a narrativa do “outsider” contra o sistema seja romântica, o ideal é que nas próximas eleições tenhamos conseguido superar o divórcio entre força institucio­nal e popularida­de. O Brasil precisa de partidos fortes. Para se manterem vivas ao longo do tempo, as ideias políticas precisam se institucio­nalizar.

É porque as máquinas perderam credibilid­ade que o apetite por candidatur­as ‘outsider’ é maior

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