Juíza deu decisão ‘histórica’ pró-casal gay
Em 2011, magistrada autorizou casamento homoafetivo direto, sem união estável anterior, e liberou adoção
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Não era uma juíza togada de gabinete. Era diferente. Ia conhecer a realidade das pessoas e não tinha preconceitos. Se todos fossem como a doutora Adriana, a Justiça iria ser mais humana
Em referência à origem humilde, ela lembrava que era uma ‘Silva’, não um ‘Júnior’, em sua categoria profissional
“Ela não era uma juíza togada de gabinete. Era diferente. Ia conhecer a realidade das pessoas e não tinha preconceitos”, diz a assistente social Suely Muniz, 58, que trabalhou por uma década ao lado da magistrada Adriana Nolasco da Silva.
Atualmente, Adriana trabalhava em uma vara em Jundiaí (a 58 km de SP). Mas fez boa parte da carreira na cidade de Cajamar, cidade de 73 mil habitantes na Grande SP onde ficou conhecida pelas decisões tidas como ousadas e à frente do seu tempo.
A mais famosa delas foi a autorização para a celebração por um cartório de um casamento homoafetivo direto, em 2011. “Foi o primeiro caso, antes de haver lei sobre isso”, diz Suely, hoje aposentada. Antes disso, explica, era necessário ter a união estável para então convertê-la em casamento.
Lembrando o ato como “um feito histórico”, a Comissão de Diversidade Sexual da OAB Jundiaí (Ordem dos Advogados do Brasil Jundiaí Seccional Jundiaí) divulgou nota em que lamenta a perda “de uma grande juíza” e de “mulher de grande humanidade”.
A magistrada também atuou em casos de adoções por casais homossexuais, como daquele cujo casamento autorizou. Três crianças, mais
SUELY MUNIZ
Assistente social e amiga da juíza OSMAR CARVALHO Motorista da magistrada por 8 anos velhas e que viviam em um abrigo, ganharam com isso uma nova casa.
Como juíza de cidade pequena, Adriana tinha atribuição de julgar casos que envolviam desde criminosos a idosos, crianças e mulheres vítimas de violência. Em todos eles, relembra Suely, procurava atender com sensibilidade.
“Se todos fossem como a doutora Adriana, a Justiça iria ser mais célere, humana e justa”, diz.
Segundo a amiga, Adriana começou no Judiciário como escrevente. Por isso, costumava dizer que era uma Silva, não ‘um Júnior’, frase que usava para descrever o fato de não ter vindo de uma linhagem de juízes.
A magistrada costumava lembrar a origem para o motorista que a acompanhava diariamente. “Ela é gente que veio de baixo, que já foi vendedora de sapato, trabalhou em lanchonete”, diz Osmar de Carvalho, 53, motorista que dirigia o carro da juíza no momento do acidente.
Carvalho trabalhava com a magistrada havia oito anos. Ele a descreve como uma pessoa “humilde” e “extremamente profissional”.
Adriana foi atingida por pedaços de concreto quando estava no banco do passageiro. O funcionário diz que, com raras exceções, ela não costumava ficar no banco traseiro.
O motorista afirma que, na noite da morte dela, a magistrada foi a um aniversário e depois passou na casa da irmã, no Ipiranga (zona sul). Nas horas seguintes, ele foi o encarregado de dar à mesma parente a notícia de que Adriana se encontrava em estado grave no Hospital das Clínicas, onde morreu.
Segundo ele, Adriana deixa uma filha de 27 anos, além da irmã e da mãe.
A Apamagis (Associação Paulista de Magistrados) emitiu nota lamentando a morte da juíza. “Todos os colegas que puderam desfrutar do convívio diário destacam predicados que ultrapassam —e muito —os limites da boa técnica jurídica, da capacidade intelectual e da ética”, afirma o comunicado.
A associação citou o vídeo em que um vereador alerta para o risco de desabamento, em caso descrito como sendo de “letargia e o descaso da administração pública”. A gestão João Doria (PSDB) afirmou ter determinado vistoria no sábado (18) após o vídeo, mas disse que não havia problemas estruturais. (ARTUR RODRIGUES).
Ela é gente que veio de baixo, que já foi vendedora de sapato, trabalhou em lanchonete